Clodoaldo Marques Leal, ou Cloro, ou ainda Cloro da farmácia, como era conhecido, era uma pessoa muito alegre, que em vida escolheu como amigo e irmão, Iderval Medeiros que se tornaram amigos inseparáveis, na alegria e na tristeza. Os dois partiram, mas ficamos eu e seu filho Junior que guardamos muito de suas alegres histórias e resolvemos publicá-las.
Raimundo era cego, e quase toda tarde tomava uma sopa em um bar próximo ao antigo mercado da cidade alta, certo dia Cloro e Iderval vão juntos falar com alguém que estava neste bar. Chegando lá, viram Raimundo -que era deficiente visual- tomando a gostosa sopa de carne de costela. Chegaram perto e repararam que tinha uma barata cascuda, aquelas grandes e escuras, era enorme dentro da sopa que já estava quase no final, mas antes que pudessem avisar a Raimundo da barata ele coloca uma das ultimas colheradas e leva à barata a boca, Iderval e Cloro se olharam, mas não podiam dizer mais nada, pois Raimundo já mastiga e engole a barata e chama o garçom afirmando – essa ameixa com bolacha que colocaram na sopa deu um gosto muito bom. O garçom não entendeu nada, pois não tinha visto à barata, e Raimundo continua, – amanhã vê se capricha na ameixa com bolacha!
Iderval e Cloro ficaram estarrecidos com tal situação e foram falar com o dono do bar, que disse não ser culpado por ter uma barata voado e caído no prato do cego, pois ninguém tinha visto nem falado nada, e sendo vizinho ao mercado, tinha muitas baratas. Passados uns três dias Iderval pergunta a Raimundo pela sopa, e ele diz – engraçado desde aquele dia que o senhor foi lá nunca mais colocaram ameixa com bolacha na sopa, devem ter colocado naquele dia porque sabiam que o senhor e seu Cloro iam tomar sopa
Conta Junior – Certo dia minha mãe me pede que eu vá à farmácia Natal pedir a papai que trouxesse certo remédio para ela, me dirijo à farmácia e chegando lá seu Cloro e meu papai já estavam de saída para Macaíba onde papai ia comprar uns seixos para colocar no seu jardim. Acompanhei os dois, e no caminho para pegarmos o carro, cruzamos com duas moças vistosas que despertaram os olhares de meu pai e seu Cloro, meu pai cheio de conversa diz, – olha Cloro já pensou o que poderíamos fazer com essas duas moças? Uma delas se vira e diz, – se enxergue seu velho enxerido, vocês dois não dão conta nem de uma quanto mais de duas como nós, seu Cloro parecia que estava com a resposta na ponta da língua diz.
– Com duas como vocês não, mas com quatro como vocês eu ia abrir um cabaré. As moças disseram uns palavrões e os dois saíram rindo.
Chegando à pedreira seu Cloro foi falar com o dono que era seu conhecido. O homem estava com um chapéu daqueles que parecia um mexicano, e pergunta pra que eram os seixos e papai responde que era para o seu jardim. O homem cheio de graça diz – vai deixar seu jardim bem redondinho né? Papai riu e não deu resposta, e o homem pergunta a ele, se ele entendia de papagaio, tenho um em casa o que quer saber? – Tenho dois papagaios e não sei quem é o macho e a fêmea, o senhor sabe? Papai diz que não, e você só vai saber se colocar os dois num quarto escuro por cinco minutos, e de repente você abre a porta, quem estiver em baixo é a fêmea, e o senhor raspa a cabeça da fêmea pra não se confundir mais.
Fomos embora, e dois dias depois o homem foi deixar a carrada de seixo, chegando lá, papai pergunta ao homem se tinha descoberto o sexo dos papagaios, o homem disse descobri, deu certo, e tira chapéu em gesto de agradecimento, e mostra uma grande careca, e papai não deixou por menos – ta dando também? O homem pergunta por que, papai diz, raspou a cabeça? O homem ri e diz – o senhor não esqueceu minha brincadeira do seu jardim redondo, papai diz – nem você esqueceu de raspar a cabeça. Os dois ficaram rindo e o homem foi embora.
Toda tarde, depois do trabalho, em torno das cinco horas, os amigos se reuniam na Farmácia Natal, de propriedade de Cloro. Iam vários amigos, de profissões diversas e á tardinha, enchiam a calçada da farmácia, para tomar um café (tinha dois cafés na esquina, Majestic e Nações Unidas) e colocar as conversas em dia.
Iderval era um gozador extrovertido, Cloro gozador, mais discreto, quase sonso, e os dois eram unha e carne, além de serem vizinhos de residência.
Certo dia Iderval chega à farmácia e pede a seu João antigo funcionário, uma vassoura, e começa a passar a vassoura varias vezes, próximo ao balcão, no mesmo lugar umas dez vezes e depois entregava a vassoura de volta a seu João e os outros olhavam curiosos, mas não perguntavam nada, e assim fazia todos os dias, e ficavam comentando – ele deve estar ficando louco, outro dizia -será que ele está ficando caduco? E assim ele continuava a fazer a mesma coisa todos os dias, até que um curioso pergunta a ele o que era aquilo que fazia com a vassoura, ele diz – estou coçando as costas de uma formiga, o outro olhou para ele com a cara de admiração e diz você deve estar ficando louco, mas no outro dia ele faz a mesma coisa, pede a vassoura e varre no mesmo lugar. Um amigo não se conteve e se abaixa para ver tal formiga, e afirma – não vi nada, Iderval responde – é ela hoje não veio.
E assim ele pegou uns dez amigos que se abaixavam pra ver a tal formiga. Brincadeiras sadias, que tornavam as tardes da Farmácia Natal, bem frequentadas.
Guga Coelho Leal – Engenheiro e escritor
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