Com as próprias mãos munidas de uma agulha, linha após linha, uma idosa de 91 anos produz roupas, luvas e sapatinhos para compor enxovais para presentear mães de recém-nascidos em Natal, no Rio Grande do Norte. Um fato, no entanto, chama a atenção: a idosa sequer conhece qualquer dessas pessoas.
As costuras de Beatriz Ferreira são entregues, na grande maioria das vezes, de forma anônima. A ideia é ser uma mãe que ajuda tantas outras mães que precisam de um certo apoio nesse início de caminhada.
Nos últimos anos, ela tem se dedicado a deixar os kits no Hospital Maternidade Januário Cicco, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, onde há muitas famílias carentes.
O motivo de fazer essa ação ao longo da vida não é nada mais do que apenas ajudar, segundo Beatriz.
“Eu me sinto feliz em fazer isso. Eu tenho prazer. No meu coração não tem espaço para maldade”, contou.
A idosa faz esses enxovais há tantos anos que ela não lembra exatamente quando começou ou quantas peças já produziu. Mas se tem algo que ela não esquece foi de onde herdou essa tradição: da avó Sabina, que era parteira no município de Santo Antônio, no interior do Rio Grande do Norte.
Ao realizar um parto e notar que uma criança não tinha recursos para o enxoval, Sabina botava a mão na massa para ajudar as famílias.
“Se a criança estava em cima da cama pelada, ela tirava uma das saias que tinha pra fazer aquela fraldinha do triângulo”, contou Beatriz, que mantém a tradição da avó.
Beatriz Ferreira tenta criar detalhes, como desenhos e imagens nos bordados, que deixem boa parte das peças feitas com uma marca especial para as mães, sejam aquelas de primeira viagem ou não.
Os grandes enxovais produzidos em décadas passadas se transformaram em kits menores nos últimos anos, o que não deixou de ajudar quem precisa.
“É dar com uma mão para que a outra não veja…não é assim que Deus disse para fazer?”, falou a idosa.
Beatriz Ferreira nunca quis guardar o que aprendeu com a avó Sabina apenas para ela. Na década de 1980, ela criou um clube de mães no bairro Cidade da Esperança, na Zona Oeste de Natal, para dar aulas de artesanato e culinária para outras mães.
“Sempre foi assim. A casa cheia, muitos trabalhos manuais, muita aula, escola, pessoas aprendendo. Ambiente bem de aprendizado mesmo”, contou o filho de Beatriz, o servidor público Josedek Albuquerque.
“Ensinava a fazer crochê…Até pão eu ensinava a fazer”, disse a idosa.
E a família passou a levar consigo também os desejos de ajudar. Em certo momento, por exemplo, Beatriz fez das filhas dela as professoras da escola em cas.
“Essa generosidade dela passou para todos os filhos. A gente sempre tem esse desejo de estar ajudando as pessoas sem querer aparecer. Ajudar porque precisa”, disse a filha Mezaabe Albuquerque, que é professora.
Os filhos contaram que a casa sempre estava cheia e que a mãe sempre tentava ajudar da forma que conseguia.
“Vinha um pessoal do interior para se consultar, fazer exame, e a casa era cheia. Eu tinha muitas vezes que doar a minha cama para outra pessoa dormir”, lembrou Débora Pires, também filha de Beatriz.
Aos 91 anos, a idosa disse que não pretende parar de fazer crochê enquanto for possível. “Até quando Deus me chamar [vou fazer]”, disse.
E o fato inspira os filhos a levaram essa cultura por muitos anos pela frente. “O exemplo que ela deu, de sempre estar ativa com a comunidade, com os familiares, com os vizinhos, com as crianças, com os idosos”, disse o filho Josedek Albuquerque.
“A minha mãe é um exemplo de vida. Ela é uma pessoa guerreira, lutadora. Tudo que ela quer, ela consegue. Desde nova que ela é assim”, reforçou a filha Mezaabe Albuquerque.
Fonte: G1RN
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