JUNHO CHEGOU COM SEUS MEDOS E ANSEIOS –
Cabeça apoiada na vassoura paro diante do calendário preso à geladeira e me ponho a perguntar: já? Sim, me pareceu tão absurdo chegarmos ao sexto mês do ano que achei imprudente jogar fora a folhinha de maio. Maio passou? Acabou? Sim, passou com uma mistura de sensações. Se por um lado foi ruidoso, devido às sirenes das ambulâncias, por outro lado foi extremamente silencioso. Sem palmas nas janelas homenageando os profissionais de saúde, as vítimas da pandemia, suas famílias, aqueles que superaram a doença, que voltaram para casa, que conseguiram se fazer morada para os sofrimentos de alguém. As palmas me fazem falta. Sentia nelas união. Como num show, onde cantamos berrando uma música famosa, fazendo eco junto a outras vozes desconhecidas. Mesmo que um desafine, os demais seguram a onda e seguimos juntos.
Não vi homenagens marcantes aos 29 mil mortos no país (pessoas, amores, nomes, não apenas números). Não vi mensagem carinhosa para os profissionais sem EPI ou com EPI detonado, lutando de frente com um inimigo invisível que nos tranca em casa. Ou deveria trancar…
Maio terminou. Parece que o cansaço nos roubou os corações e permitimos que o marasmo nos dominasse. Que dó de nós que nos entregamos à apatia e não nos escandalizamos com a dor alheia… Que dó!
Maio nos mostrou que insistimos em transparecer que tudo está normal, que podemos nos entregar às dietas ou às compras on line para “fazer de conta” que tudo está na paz. Entretanto, não está! Em maio mataram João Pedro, 14 anos, no Rio de Janeiro. Setenta e um tiros foram ouvidos. Mataram George Floyd nos Estados Unidos. Rafael Winkes, 11 anos, foi morto pela própria mãe. Tanto George como Rafael foram mortos lhes tirando um bem gratuito: o ar! Morreram por asfixia. Sem ar… Assim como o covid-19 matou mais de 20 mil pessoas aqui no Brasil. Só em maio.
Maio acabou nos alertando que a maldade está aí. Seja utilizando farda e desculpas de raça, cor, sexo ou situação social. Seja dentro de casa, disfarçada em carinho e cuidado maternal. Que ironia o mês destinado às Mães nos ensinar isso.
E, de repente, chega junho.
Mais um mês em branco nos mostrando que podemos ser diferentes, melhores. Junho chega cheio de recordações. O som da sanfona, o tilintar do triângulo. As bombinhas nos pés das crianças. As tranças com fitas coloridas, os chapéus de palha. As quadrilhas organizadas e seus figurinos chamativos ou aquelas completamente desorganizadas que nos arrancam gargalhadas e nos fazem dançar com um desconhecido. Anarriê, balancê, olha a chuva!
Junho chega com cheiro de fogueira e de milho assado. Sabor de pamonha e canjica, arroz-doce e bolo pé-de-moleque. Festas com bandeirolas, casamentos matutos, apresentações nas escolas. Simpatia para conseguir marido, orações nos interiores aos santos protetores. Santo Antônio, São João, São Pedro! Protegei-nos.
Ele chegava assim…
Hoje ele veio cheio de incertezas, tristezas. Mas, também, veio com esperança. Sim, esperança! Esperança em dias melhores. Esperança de logo mais estarmos juntos, podendo falar: lembra da época da pandemia? E rirmos de nossas experiências! Anseio por estas risadas olhando nos olhos, tocando as mãos, enxugando as lágrimas de alegria que virão. Junho chegou com 30 dias disponíveis para nos reinventarmos. Para colorir nossas famílias com paz, para cantarmos os hinos de Luiz Gonzaga e Dominguinhos enchendo nossas casas de felicidade e mostrando que os corações podem até trincar (pois eles trincam), no entanto, temos um Pai incrível que nos coloca no colo, faz cafuné na cabeça e diz: Estou aqui! Não vos preocupeis.
Feliz mês junino para todos nós!
Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista e Professora universitária