JUNHO, ÊTA MÊS ARRETADO! –

E então eu havia passado duas semanas tentando dissertar sobre o tema São João. Algumas ideias chegavam e se iam com a mesma intensidade. Os dias passavam e nada de surgir uma boa prosa, que valesse a coragem de transcrevê-la para o papel em branco, quase amarelado e um tanto amarrotado, de tanto passar da pasta de rascunhos para cima do birô, e do birô sendo recolhido, sem nada escrito, para a pasta de rascunhos.

Andei vagando, sem nada bacana para dizer. Arrisquei passear pelo universo do horóscopo e “curiar” o signo das pessoas que nascem no mês de São João, aí vi esse trecho que falava sobre o perfil do geminiano:

“Costumam ser bastante alegres e brincalhões. Adoram literatura e tendem a ler vários livros ao mesmo tempo. Se conseguirem, irão discorrer sobre eles sempre que surgir alguém disposto a escutar. Podem ter também pendor para a escrita, e talento não lhes falta para isso. Suas ideias, quase sempre, são originalíssimas. Todavia, falta-lhes um tanto de estabilidade para conseguirem torná-las reais.” (http://www.estrelaguia.com.br/horoscopo/gêmeos/perfil).

Esse trecho me fez lembrar alguém que eu conheço… Entendi, eu tinha que buscar uma “ideia originalíssima”. As ideias saltitaram feito milho de pipoca estourando na panela. Como eu não havia pensado nisso antes? Junho tem um significado marcante em minha vida…
Nasci no mês de junho, no dia 08 de um tempo recente – sou bem novinha, cheirando a leite, um “piteuzinho” (Me engana que eu gosto).

Conta minha tia avó que minha mãe estava com sete meses de gestação quando, numa visita de rotina ao médico, durante os exames de praxe, foi anunciado, num alarme de dar gosto, que o bebê não apresentava batimentos cardíacos, ou seja, eu estava “mortinha da Silva”.

– Alto lá!! – gritou minha guardiã e tia avó, paraibana e mulher macho sim sinhô, que acompanhava minha mãe na consulta médica.

Ela continuou em sua argumentação, própria de uma parteira daqueles tempos.

– Eu mesma ouvi a criança há poucos instantes, exijo que seja feito o parto imediatamente.

E quem era besta de contrariá-la?! Vai que ela estivesse armada até os dentes, com uma peixeira embainhada no cós da saia? E foi nessa agonia que levaram minha mãe para a sala de parto.

Eu tapeei a todos! Fingi-me de morta, de propósito. Ora, se eu ia ser doida de nascer só quando minha mãe completasse nove meses de gestação, logo no mês de agosto – mês de desgosto, como escracham as crenças populares. Avexei-me, cuidei logo em arrumar um jeito bem enfático de ver as quermesses, os arraiás e o fole da sanfona tocando o forró do Rei do Baião.

Nem amarrada pelo cordão umbilical eu ia perder o puxador da quadrilha gritando “anarriê, alavantú, balancê”… Isso, sem falar na melhor parte, que é quando o puxador diz:

– Changê!! Changê!! Changê!! – passando por todos os cavalheiros, até recuperar seu par. Ainda mais que ando numa peleja só para recuperar os ímpares que me tornam par.

Tudo que eu queria era ser uma autêntica nordestina, geminiana é claro. Minha gente, eu não digo é nada! Depois que eu me arreto, sai de baixo que não tem quem me segure – nem a barriga da minha mãe. Cheguei ao mundo no meio dos festejos juninos. Fui recebida com show pirotécnico, céu estrelado, chão iluminado pelas fogueiras, festa dançante e mesa farta das comidas de milho. Nascimento digno de uma boa caipira, nordestina da gema.

Sabe do que mais, andei conjecturando com meus botões, estou achando que, lá pelas bandas lá de casa, teve até quadrilha improvisada, para comemorar o parto improvável e inesperado da bichinha traquinas que se fingiu de morta para não perder o São João.

“Danôsse!”, “Arre égua!”, “Se avexe não, que a burrinha da felicidade nunca se atrasa…”

– Changê!! Changê!! Changê!!

 

 

 

 

 

 

 

Flávia Arruda – Pedagoga e escritora, autora do livro As esquinas da minha existência, [email protected]

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