LAMARTINE BABO, O COMPOSITOR E A SERRA –

Lamartine de Azevedo Babo, o Lalá, nasceu no Rio de Janeiro, em 8 de março de 1904, na rua Teófilo Otoni, Centro. Filho de Leopoldo Azevedo Babo

e Bernarda Preciosa Gonçalves, que juntos  tiveram onze filhos, dos quais somente três  chegaram à idade adulta: Lamartine, Leopoldo e Indiana.

Família com DNA musical, sua mãe e sua irmã tocavam muito bem piano; sua casa era frequentada por músicos de expressão maior, como Catulo da Paixão Cearense (que é maranhense) e Ernesto Nazateth. Aos 13 anos compôs sua primeira valsa, “Torturas do Amor”, e aos 16 escreveu a opereta “Cibele”. Estudou inicialmente em escola pública, depois no Colégio São Bento e no  Colégio Pedro II, onde se  formou em Letras.

Em 1916, seu Leopoldo faleceu, e Lamartine foi morar com a sua irmã  Indiana; passou a trabalhar como office-boy da Light; um ano depois trocou de emprego, indo trabalhar numa Companhia de Seguros, onde demorou pouco; com mais tempo disponível, passou a se dedicar mais ao teatro de revistas e ao jornalismo.

Em 1929, conheceu e fez apresentações com o Bando de  Tangarás, conjunto musical tendo como fundadores: Carlos Alberto Ferreira Braga (Braguinha/João de Barro), Alvinho, Henrique Brito (potiguar, falecido precocemente aos 27 anos, no Rio de Janeiro/RJ), Henrique Fóreis Domingues (o Almirante).

Participou de vários programas de rádio, nos quais fez muito sucesso, entre eles o Trem da Alegria, ao lado do radialista Heber de Bôscoli. Foi nesse programa que recebeu o desafio para compor um hino popular para cada clube de futebol do Rio de Janeiro; desafio aceito e rigorosamente cumprido; com uma curiosidade: passou seis dias trancado num apartamento e só saiu quando os hinos estavam prontos (Flamengo, Vasco, Fluminense, Botafogo, América – seu time de coração, sua grande paixão – e Bangu), depois concluiu com o do Olaria, Madureira, São Cristóvão, Bonsucesso e Canto do Rio.

Em 1951, com 47 anos, Lamartine conheceu Maria José, com quem casou numa cerimônia fechada, e  com a qual permaneceu até o fim de sua vida.

Um fato histórico e hilário merece destaque na vida desse expressivo compositor, referente à sua mais bela canção, “Serra da Boa Esperança”(1937). Existem algumas versões do ocorrido, porém passo a relatar aquela que mais se aproxima da verdade:

Em 1935, na pequena e humilde cidade interiorana de Minas Gerais, conhecida por Dores da Boa Esperança, vivia um dentista/músico que tinha a mania de colecionar fotografias autografadas de cantores e compositores famosos (os seus verdadeiros ídolos). Lamartine fazia  parte da sua galeria de famosos. Através  de cartas e mais cartas, o fã não conseguiu o seu objetivo (a fotografia autografada). Assim sendo, criou  uma artimanha para alcançar a sua difícil missão: fraudar a correspondência, mudando o nome e o sexo do remetente, usando sua sobrinha de apenas 10 anos, Nair Pimenta. A inusitada ideia funcionou; carta  vai, carta vem, fluindo em versos, prosas, sonetos e romance. A falsa verdade encantou  Lamartine, que, no entanto, enviou  poucas fotos, em 3×4, não satisfazendo por completo o exigente fã , que, percebendo a dificuldade de conseguir por completo o seu objetivo, resolveu, em nome de Nair, acabar o “romance postal”, alegando que vai se casar e residir na cidade de São Paulo/SP.

Um ano depois (1936), o músico, não mais usando o nome da sobrinha, mas a sua própria identidade, resolveu convidar Lamartine para o baile de estreia  da orquestra criada por ele próprio (músico/fã).

Não houve dúvida, Lamartine se animou e aceitou  o convite, esperando encontrar a tão misteriosa e amável Nair. Chegou um mês depois à cidade e se hospedou no Hotel da família do músico (por sinal o mesmo endereço das correspondências amorosas). Logo percebeu Lalá que a única Nair encontrada no local era uma criança. A trama do músico/dentista só viria a ser descoberta após uma inconfidência (mineira) de um dos moradores, que passou a história a limpo.

Apesar do constrangimento e da decepção, tudo foi esclarecido e a  agradável e solidária companhia de um grupo de vinte jovens, rapazes, moças e músicos (que depois Lalá chamaria de “Minhas 20 saudades dorenses”), aliviaram e abrilhantaram o encontro.

Em agosto de 1937, na despedida da cidade que tão bem lhe acolheu, e olhando para a Serra da Boa Esperança que emoldurava a paisagem, começou a solfejar as notas que o amigo músico/fã ia anotando na pauta improvisada num pedaço de papel de jornal, originando a letra de uma das mais  belas canções da música brasileira: “Serra da Boa Esperança”: “Parto levando saudades,/ Saudades deixando,/ Murchas, caídas na serra,/ Bem perto de Deus/ Oh, minha serra,/ Eis a hora do adeus/ Vou-me embora/ Deixo a luz do olhar/ No teu luar/ Adeus!…”.

Em 16 de junho de 1963, aos 59 anos, Lamartine faleceu na cidade do Rio de Janeiro, vítima de um enfarte do miocárdio.

 

Berilo de CastroMédico e Escritor –  [email protected]

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Uma resposta

  1. Grande Berilo. Esbanjando seus conhecimentos e gosto pelas grandes personagens musicais. Hoje subi mas um degrau da minha escada de conhecimento musical. Obrigado é um forte e fraternal abraço.

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