Louvado Seja era o apelido de um pedinte de Nova- Cruz, que sofria de um distúrbio nervoso, que o impulsionava a dar constantes carreiras, involuntariamente, com pequenos intervalos. Seu apelido foi motivado pela louvação que dizia ao pedir uma esmola: LOUVADO SEJA NOSSO SENHOR JESUS CRISTO! E vinha a resposta das pessoas que lhe davam esmolas: PARA SEMPRE SEJA LOUVADO!
Esse homem provocava medo às crianças, que, se estivessem na calçada, entravam em casa ligeiro, ao ouvirem a louvação do pedinte. O medo era consequência de boatos que se espalharam pela cidade, de que o pedinte tinha um “encosto”, ou mau espírito, que o empurrava o tempo todo e o fazia correr em disparada. Diziam que isso era obra do demônio. As pessoas ingênuas e céticas acreditavam que isso fosse verdade.
De longe, ouvia-se a voz do pedinte, quase gritando: “Louvado Seja Nosso Senhor Jesus Cristo! “
Assustados, os meninos corriam para casa.
Louvado seja chegava às portas correndo, recebia as esmolas que punha numa sacola de pano, que trazia pendurada ao ombro, e saia correndo, repetindo o costumeiro jargão, em agradecimento: “Louvado Seja Nosso Senhor Jesus Cristo! Deus lhe pague”!
As crianças tinham pavor a ele, inclusive eu. Minha avó paterna, dona Júlia, nunca deixou de lhe dar uma esmola, nem tinha medo dele. Eu, que vivia muito na casa dela, que era vizinha à nossa, quando o avistava, tremia de medo e entrava correndo na nossa casa, pelo quintal, e me agarrava na saia da minha mãe. Ela me abraçava e tentava me explicar que Louvado Seja não fazia mal a ninguém e que o problema dele era uma doença.
Nova-Cruz, nessa época, era uma cidade muito atrasada, e, praticamente, sem assistência médica.
Minha mãe, Lia Pimentel, possuía um livro comprado em Natal, chamado “Medicina do Lar”, que fazia referência a esses sintomas como sendo próprios da “doença de São Guido” ou São Vito, doença que causa movimentos espasmódicos incontroláveis nos membros inferiores.
Ela relacionou essa informação à doença de Louvado Seja. Mas não comentou com ninguém, pois não era médica nem tinha certeza de que aquela informação fosse verdadeira. O fato é que Louvado Seja padeceu a vida toda desse mal, e nunca fez um exame médico. Era tido como um homem dominado por uma entidade espiritual, ou encosto. O estranho é que, mentalmente, era são.
Ainda hoje me lembro de Louvado Seja, e sinto medo. As carreiras rápidas, constantes e incontroláveis, e sua voz grossa me faziam tremer de medo. A louvação que ele fazia ao pedir esmolas soava tétrica aos meus ouvidos de criança. Tinha a aparência de um boneco movido a cordas. Apesar dos impulsos ou empurrões que, supostamente, levava do “espírito” que incorporava, Louvado Seja nunca foi visto caindo.
Deus o protegia.
O caso mais hilário, apesar de triste, foi a carreira que, involuntariamente, Louvado Seja deu no entregador de pão de Nova-Cruz, seu Anízio, que, segurando o cesto de pão na cabeça, viu-se obrigado a descer a ladeira da rua Alberto Maranhão em disparada, sentindo-se perseguido por um suposto malfeitor, que corria em seu encalço.