MAIS SENTENÇAS… –

O meu amigo Jurandyr Navarro, confrade da Academia Norte-rio-grandense de Letras, presidente do Instituto Histórico e Geográfico, grande causídico e excelente figura humana, honrou-me dizendo que havia distribuído cópias do artigo “Sentenças e sentenças”, resultado de uma compilação que fiz de material recebido pela Internet. Recebo de Roberto Furtado, o nosso amigo Bob, neurologista, que me abastece há anos com tudo que há de bom na Internet, mais uma sentença que transcrevo a seguir.

A Torre do Tombo é o local onde se guardam documentos antigos. Está situada em Lisboa, junto à Cidade Universitária. Daí vem o termo “tombar” que, por analogia com a Torre de Tombo, significa o Estado pôr sob sua guarda, bens móveis e imóveis cuja conservação e proteção sejam do interesse público, por seu valor histórico, ou artístico, ou arqueológico, ou etnográfico, ou paisagístico ou bibliográfico, para os conservar e proteger.

No Arquivo Nacional da Torre do Tombo (armário 5, maço7), consta uma Sentença proferida em 1587, no processo contra o prior de Trancoso, Portugal:

“Padre Francisco da Costa, prior de Trancoso,  idade de sessenta e dois anos, será degredado de suas ordens e arrastado pelas ruas públicas nos rabos dos cavalos, esquartejado o seu corpo e postos os quartos, cabeça e mãos em diferentes distritos, pelo crime que foi arguido e que ele mesmo não contrariou.

Sendo acusado: de ter dormido com vinte e nove afilhadas e tendo delas noventa e sete filhas e trinta e sete filhos; de cinco irmãs teve dezoito filhas; de nove comadres trinta e oito filhos e dezoito filhas; de sete amas teve vinte e nove filhos e cinco filhas; de duas escravas teve vinte e um filhos e sete filhas; dormiu com uma tia, chamada Ana da Cunha, de quem teve três filhas. Total: duzentos e noventa e nove, sendo duzentos e catorze do sexo feminino e oitenta e cinco do sexo masculino, tendo concebido em cinquenta e três mulheres”.

Não satisfeito tal apetite, o malfadado prior, dormia ainda com um escravo adolescente de nome Joaquim Bento, que o acusou de abusar em seu vaso nefando noites seguidas quando não lá estavam as mulheres.

Acusam-lhe ainda, dois ajudantes de missa, infantes menores,  que lhe foram obrigados a servir de pecados orais completos e nefandos, pelos quais se culpam em defeso de seus vasos intocados, apesar da malícia exigente do malfadado prior.

“El-Rei D. João II lhe perdoou a morte e o mandou pôr em liberdade aos dezessete dias do mês de Março de 1587, com o fundamento de ajudar a povoar aquela região da Beira Alta, tão despovoada ao tempo e, em proveito de sua real fazenda, o condena ao degredo em terras de Santa Cruz, para onde segue a viver na Vila da Baía de Salvador como colaborador de povoamento português. El-rei ordena ainda guardar no Real Arquivo esta sentença, devassa e mais papéis que formaram o processo”.

Inusitado é o perdão acima, dado pelo El-rei D. João II, com o fundamento de “ajudar a povoar aquela região da Beira Alta”. Outro fato interessante é a adição de mais um sinônimo para o forever. Vaso nefando! Fica a dica aí para os poetas. Daria um excelente título para um poema: Ode ao vaso nefando!

Em tempo: nada como consultar o velho Aurélio. Vejam o que ele diz do nefando.

[Do lat. nefandu.] Adjetivo.
1.Indigno de se nomear; abominável, execrável, execrando, aborrecível, infando:
“Cativou-me uma dama de Sevilha, / Foi isso um crime que julguei nefando; / Tive remorsos!… (Por que choras, filha?!)” (Raimundo Correia, Poesias, p. 114.)
2.Sacrílego, ímpio.
3.Perverso, malvado, nefário.

 

 

Armando Negreiros – Médico e Escritor
As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *