MARIA SALOMÉ –

Em 1054, em razão do Cisma do Oriente, a autoridade papal ficou dividida, a gerar a dicotomia de Igreja Católica Apostólica Romana e Igreja Católica Apostólica Ortodoxa, sendo que essa última apenas reconhece as decisões dos Concílios de Nicéia-I (325), Constantinopla-I (381), Éfeso (431), Calcedônia (451), Constantinopla- III (680) e Nicéia II (787).

Cristo em sua peregrinação terrestre nada escreveu, apenas viveu em companhia de apóstolos, que procederam registros, a gerar evangelhos de toda ordem, uns considerados apócrifos, outros não, a mercê de vontades e interesses das igrejas.

Diz a Bíblia, que Salomé foi uma seguidora do Rabi, identificada nos evangelhos canônicos como esposa de Zebedeu, pais de Tiago e João, dois apóstolos.

Na Igreja é conhecida como Maria Salomé, tia de Jesus, uma das Três Marias, festejada no dia 22 de outubro.

O Evangelho de Tomé (Dídimo), o gêmeo, encontrado em Nag Hammadi, escrito em copta e em grego, em seu registro 61, lança palavras, atinentes a Salomé, que teriam sido ditas pelo Nazareno, que nada deixou escrito.

Vejamos, então, esse documento, dito apócrifo, encontrado em 1945, no Egito, ora no Museu Copto do Cairo:

“61 – Jesus disse: Haverá dois na mesma cama: um morrerá, o outro viverá.

– Salomé disse: Quem és tu, ó homem? Como que saído de um só? Tu que usavas a minha cama e comias à minha mesa?

– Responde Jesus: Eu vim daquele que é todo um em si; isto me foi dado por meu Pai.

– Disse Salomé: Eu sou discípula tua.

Vem a propósito o dito: – Quando o discípulo é vácuo, será repleto de luz; mas quando é dividido, ele será repleto de treva.”

Essa Salomé é aquela que estava presente no momento do sepultamento de Jesus.

A história da Antiguidade, todavia, apresenta-nos a segunda Salomé, aquela que dançou para o Rei Herodes Antipas, figura que não está na Bíblia, mas evangelhos nos contam acerca do assassinato do apóstolo. João Batista, em 29 d.C., ao final de um banquete, em Maqueronte, uma de suas fortalezas.

Salomé era filha de Herodíade de um primeiro casamento. Após, Herodes Antipas casou com a sua mãe. Ocorre que Herodíade exigia que o profeta João Batista fosse executado, face insultos a ela lançados.

Assim, a bela e insinuante Salomé, ao dançar durante um banquete, encantou Herodes, que lhe disse:

“Tudo o que você me pedir, eu darei a você, mesmo que seja metade do meu reino.”

– “Salomé, então, sob a influência de sua mãe, reivindicou “em um prato, a cabeça de João Batista”.

Herodes Antipas, mesmo sabendo que João Batista era um homem bom, mandou decapitá-lo, oferecendo a Salomé a cabeça do apóstolo numa bandeja.

Herodíade – a mãe de Salomé–, odiava João Batista, então preso nas masmorras do palácio, porque ele lhe acusava de adultério, por ter deixado seu primeiro esposo, Herodes Filipe, para juntar-se ao irmão dele, Herodes Antipas.

Cumpre destacar que, ao tratar da prisão de João Batista, o historiador judeu Flávio Josefo, não faz qualquer referência a Salomé ou ao banquete, onde teria sido decretada a sua execução.

Gustave Flaubert, in A Cabeça de Iokanaan, escreve em seu conto Herodíade:

As fábulas e os contos têm o condão da magia, o sincretismo do porvir, a incongruência das reflexões metafóricas!

“(…) Por que não me olhas, Iocanaan? Teus olhos, que eram terríveis, tão cheios de ódio e escárnio, estão fechados agora. Por que estão fechados? Abre-os! Ergue as pálpebras, Iocanaan! Por que não me olhas? Estás com medo de mim, Iocanaan, e por isso não me olhas? E a tua língua, que era como uma serpente vermelha expelindo veneno, não se move mais, nada diz agora, Iocanaan, aquela víbora vermelha que cuspilhava veneno contra mim? É estranho, não? Como é que a víbora vermelha já não se move?… Consideraste-me ninguém, Iocanaan. Desprezaste-me. Pronunciaste ignóbeis palavras contra mim. Trataste-me como uma meretriz, uma dissoluta, a mim, Salomé, filha de Herodíade, princesa da Judeia! Bem, Iocanaan, eu estou viva; mas tu estás morto e tua cabeça me pertence (…)”.

(Biblioteke Virtual- códices da Biblioteca de Nag Hammadi)

“Ah! Se a vossa liberdade
Zelosamente guardais,
Como sois usurpadores
Da liberdade dos mais?”

(Fábula – O passarinho preso – Manuel Bocage – Manuel Maria Barbosa Du Bocage).

 

 

 

 

José Carlos Gentili – jornalista

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