MESA DAS CRIANÇAS –

Mamãe, que não esquece o aniversário de ninguém, errou a data de um de meus primos. Ao acordar e olhar o grupo no celular tem inúmeras mensagens de mamãe dando os parabéns a Juninho.

Ele atenciosamente agradece e diz que faltam dois dias, mas “o que seria aquilo diante do mais de meio século de vida”?

Mais de meio século? Como o tempo passou tão veloz?

Fechei os olhos e vi a todos nós, os primos, deitados apinhados em um dos quartos da casa de nossos avós gravando músicas que pareciam com alguém da família para fazer uma brincadeira na noite de Natal.

Uma fita cassete que ia e vinha diante do gravador preto com botões duros e resistentes ao apertarmos ao mesmo tempo: rec e play. Inúmeras vezes!

“Não me interessa se ela é coroa, panela velha é que faz comida boa.”

A música de Sérgio Reis foi escolhida para uma amiga da família que faleceu por estes dias.

Uma das poucas que me recordo nitidamente. Talvez por ter arrancado risadas dos adultos na hora que a apresentamos. Diante disso, sentimo-nos orgulhosos por nossa criatividade.

Fecho os olhos mais uma vez e vejo que sentávamos à mesa das crianças.

As crianças agora estão na faixa dos 50!

Lembrei da vontade de crescer! Quando olhávamos os adultos, nossos pais, sentados na outra mesa, compartilhando conversas que nem sempre entendíamos e algumas vezes não podíamos participar. Como quando eu quis assistir Gabriela cravo e canela em meio a um veraneio em Cabedelo, na Paraíba, e papai não me permitiu:

– Filme para adulto, Barbele. Você não tem idade.

E eu não entendia o que podia ser tão horrível que meus olhos não pudessem enxergar.

Hoje eu entendo.

Hoje eu compreendo suas preocupações de pais, tios e avós.

As crianças agora estão na faixa dos 50!

Temos profissões, casamentos, filhos.

Temos problemas, desilusões, decepções.

Temos medo do mundo que entregamos aos nossos filhos e compartilhamos em conversas em tom mais baixo as curvas que a vida nos apresentou durante nossa caminhada… Como acontecia na mesa dos adultos…

Agora somos nós… Somos nós os adultos!

Hoje, de verdade, gostaria de ainda poder sentar à mesa das crianças sem me preocupar se o garfo deve ficar à direita ou à esquerda, sem me cobrar por não poder colocar os cotovelos sobre a mesa e, mais ainda!, sem me preocupar em escolher o que todos comerão!

Hoje, de verdade, gostaria de ainda poder sentar à mesa das crianças e esquecer que o tempo é realmente veloz e se não soubermos aproveitar os momentos, não temos como voltar atrás.

Mas, no fundo, sei que este é um dos maiores aprendizados que temos e, mesmo em meio à saudade de um tempo leve e feliz, sei que foi isso que me fez ser quem sou.

Então, só agradeço a Deus e me permito anotar mentalmente de no dia certo, dar os parabéns a Juninho…

 

 

 

 

Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, professora universitária e escritora

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores

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