MINHAS LIVRARIAS EM ROMA II –

​Encerrei o meu artigo da semana passada – sobre alguns comércios de livros nos bairros romanos do Esquilino e do Quirinale – tratando da imponente “Biblioteca Nazionale Centrale di Roma”.

​Pegando isso como um gancho, no texto de hoje, darei logo um salto do Rione Esquilino, onde fica a dita “Biblioteca Nazionale Centrale di Roma”, para o Rione Parione, onde fica outro “templo” dedicado aos livros: a “Chiesa di Santa Barbara dei Librai” (“Igreja de Santa Bárbara dos Livreiros”), assim conhecida porque concedida, lá pelos anos 1600, a uma tal “Confraria dos Livreiros”, que abarcaria, além destes, os editores e os escritores. Ela fica, para que vocês tenham uma ideia mais precisa, nas cercanias da muito visitada “Piazza Campo de’ Fiori” (onde, já adianto, não dá para chegar próximo via metrô). Muito antiga (consta que foi consagrada em 1306, embora a igreja ali já datasse de bem antes), foi reformada, abandonada, desconsagrada e reformada novamente mais de uma vez. É pequenina, mas bela, como quase todas as igrejas romanas. Taí um local onde nós, amantes dos livros, podemos rezar para ter nossos pecados, passados e futuros, perdoados. Topei com ela (quase) sem querer e foi isso que eu, cheio de pecados, fiz.

Naquela mesma região fica a livraria “Fahrenheit 451”, precisamente no número 44 do Campo de’ Fiori, praça há muito tempo famosa por ter sido o local onde Giordano Bruno (1548-1600), acusado de heresia, foi impiedosamente queimado vivo (em 1600). Uma estátua do dito cujo está no centro da praça, até para que não nos esqueçamos desse triste episódio na história da Igreja Católica Apostólica Romana. Livraria generalista, fundada em 1989, a “Fahrenheit 451” é uma instituição cultural italiana. Tem muita coisa: livros sobre arte, cinema, teatro, fotografia, livros de história, política, filosofia, livros de viagem, obras de ficção, sem falar nas promoções que estão sempre ali. O nome, claro, nos remete a Ray Bradbury (1920-2012) e o seu “Fahrenheit 451” (1953), por sua vez um livro – um romance distópico, mais precisamente – sobre livros. Uma vantagem imensa: como uma exceção à regra romana, ela fecha tarde, quase sempre à meia-noite ou até mesmo madrugada adentro. E, tirando o olhar sinistro do Giordano, gostando você de vinhos ou livros, é sempre prazeroso passear, boemicamente, pelo Campo de’ Fiori.

Quem também ficava por ali, só um pouquinho mais ao norte, era a famosa “Libreria Croce”, no número 156 do Corso Vittorio Emanuele II, outrora frequentada por gente como Alberto Moravia (1907-1990) e Pier Paolo Pasolini (1922-1975). Eu não era frequentador da “Croce”, muito menos sou da estirpe de um Moravia ou de um Pasolini, mas cheguei a ir lá. E é de fato uma pena que a crise pela qual passa o setor (de livrarias, quero dizer) tenha levado ao fechamento desse clássico comércio de livros. E, segundo me consta, o mesmo destino teve a “Libreria Croce” da Via Solferino, número 7a/b, que, aliás, esqueci de dizer no primeiro artigo desta série, ficava muitíssimo perto do hotel que habitei em Roma.

​Também pertinho dali, caminhando para o leste pelo Corso Vittorio Emanuele II, no número 11 do Largo di Torre Argentina (onde estão, à nossa vista, as ruínas de vários monumentos da época romana, entre elas as do Teatro de Pompeu), fica a excelente livraria romana “La Feltrinelli”. No estilo da inglesa “Waterstones” ou da americana “Barnes & Noble”, é uma livraria enorme e moderna. Servindo a um público bem amplo, “La Feltrinelli” vende de quase tudo: livros de vários assuntos em várias línguas, revistas, DVDs, coisitas para leitura, eletrônicos e por aí vai. Sem falar na cafeteria, que não podia faltar. Ali você gastará, com certeza satisfeito, alguns ou muitos euros. Ademais, essa não é a única “La Feltrinelli” romana. Posso apontar pelo menos outras três nos seguintes endereços: Viale Giulio Cesare 88, Via Vittorio Emanuele Orlando 84 e Via Appia Nuova 427.

Não muito longe, apenas um pouco mais ao norte, mas ainda no Rione Parione, nas beiradas da Piazza Navona, no número 10 da Via dei Sediari, fica a “Libreria Editrice ASEQ”. Vale muito a pena dar um pulo lá. Primeiramente porque a Piazza Navona – com sua igreja de “Sant’Agne in Agone”, de Francesco Borromini (1599-1667), e sua “Fontana dei Quattro Fiumi”, de Gian Lorenzo Bernini (1598-1680) – é belíssima. Como também belíssimo, dominando boa parte da praça, é o “Palazzo Pamphili”, sede da nossa embaixada na Itália, onde, recordo-me bem, fomos formalmente recebidos, pela Missão brasileira, quando do 1º Encontro Internacional da Associação Nacional dos Procuradores da República – ANPR. Em segundo lugar porque a “Libreria Editrice ASEQ” é charmosíssima, embora, com seu catálogo de livros de filosofias heréticas, ciências ocultas, alquimia, pura magia e por aí vai, seja um tanto exotérica. Mas o que não é exotérico na Roma dos césares e dos papas? No mais, é uma livraria à moda antiga, que vende livros novos e usados, com a simpatia dos velhos livreiros.

Por fim, nos arredores da Piazza Navona ainda ficam duas outras excelentes livrarias: a “Altroquando” (especializada em cinema) e a “Librairie Francaise”. Entretanto, como são comércios especializados, sobre elas conversaremos no artigo da semana que vem. Afinal, preciso dar uma mínima ordem ao nosso “roteiro livresco” romano.

 

Marcelo Alves Dias de Souza – Procurador Regional da República, Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL e Mestre em Direito pela PUC/SP

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