MÚSICA –

Eu me pergunto. Como diabo vim gostar tanto de música clássica? Meu tempo de menino foi ouvindo música brasileira o tempo todo. Meu pai gostava, cedo comprou uma daqueles vitrolas de corda (depois comprou uma eletrônica), que você mudava a agulha, e comprava discos em quantidades e dos mais variados.

Tinha predileção por música brasileira, óbvio, mas, de vez em quando comprava alguns tangos e valsas. Portanto, fui criado escutando de “Jararaca e Ratinho” até Strauss. Também comprava alguns tangos.

Esse foi o meu ambiente musical por muitos anos. Com a guerra, chegaram os americanos com a sua música, com o jazz e suas variantes, que passaram rapidamente a dominar a cidade. Não havia um só bar de Natal que não tivesse uma daquelas máquinas que você põe uma moeda e escolhe a música. Acho que a marca era ˜Wurlitzer”. Como a grande maioria dos frequentadores eram americanos, era jazz o tempo todo. E eu gostava muito.

A música brasileira já começava a tomar novos ares. Se antes eram os jararacas e ratinhos, começaram a surgir com mais intensidade os Nelsons Gonçalves da vida, que deram um novo alento a nossa música. Mas, aqui, a americana dominava. Além do cinema, haviam orquestras americanas que vinham tocar para os pracinhas e tocavam também em coretos e locais semelhantes da cidade. De graça, aberto para todos assistirem. Tocavam de tudo, inclusive músicas brasileiras. Influência de Carmem Miranda.

Para nossa sorte, surgiu Jobim, que pode ser representado como o homem da bossa nova, e mudou para sempre o conceito de música brasileira. Criações memoráveis, junto com outros compositores semelhantes, e melodias inesquecíveis.

Mas, e a música clássica? Via no cinema, alguns filmes excelentes e inesquecíveis, como o sobre a vida de Chopin. Também muitos filmes eram acompanhados por músicas clássicas, e isso influenciou. Comecei a comprar para mim alguns discos de clássicos que gostava. Descobri dois grandes amigos aficionados, Eudes Moura e Solon (Solozinho) Galvão Filho, e começamos a ouvir juntos e comentar. Eudes era o mais conhecedor, pois havia morado na França e na Inglaterra. Solon já havia passado um tempo nos Estados Unidos. E começamos a ouvir música juntos, sempre que surgia uma oportunidade.

Aí eu fui para os EUA. Na Universidade, fiz um curso de ‘Apreciação Musical’ numa hora vaga, que me ajudou muito, inclusive descobrindo novos compositores e suas interpretações. Continuei comprando discos e fiz uma boa coleção. Quando voltei, continuamos escutando música juntos, quando podíamos. Comparar orquestras, compositores, intérpretes, agora com mais conhecimento. Também fiz um curso pela internet, na Yale University, com o Professor Craig Wright, alias muito bom, sobre apreciação musical, compositores, instrumentos. Comprei o livro, “Listen to Music”, ótimo. As músicas que serviam de exemplo, bem como o curso, foram grátis.

E o tango? Sempre gostei de tango. Já tinha ido a Buenos Aires em razão do meu trabalho na OEA. Quando voltei, passei a ir à passeio. Os preços razoáveis, os hotéis bons e a cidade muito agradável. E o povo nos recebia muito bem. Minhas noites eram dedicadas a conhecer casas de tango. Tenho uma coleção razoável de discos.

E agora, com YouTube, não preciso mais sair de Natal. Você tem tudo dentro de sua casa, sem gastar um centavo. Ouve o que quiser, de onde quiser, na hora que quiser. É o meu passatempo predileto, acompanhado, claro, de um bom whisky. Afinal, com noventa anos, já tenho direito a fazer o que gosto.

 

 

 

Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores
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