NA SAÚDE E NA DOENÇA –
O noivo pode até ignorar detalhes da festa ou do vestido da noiva na cerimônia do casamento; a noiva, por sua vez, pode não lembrar o modelo do traje do amado ou do buquê que lançou para as amigas; porém, certamente ambos jamais esquecerão o instante do juramento proferido no altar durante a união do casal:
Eu (fulano ou fulana) recebo a ti, (fulana ou fulano), como minha legítima esposa (ou legítimo marido), e prometo ser-te fiel, amar-te e respeitar-te, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, por todos os dias de nossa vida, até que a morte nos separe.
A empolgação daquele momento realça no imaginário de ambos somente os pontos positivos da promessa declarada: alegria, saúde, riqueza, amor e fidelidade. Ninguém atenta para o reverso da medalha, onde e quando poderão enfrentar tristezas, doenças ou a pobreza em algum momento da união.
Não importa e nem existe espaço para tais pensamentos. Ali eles vivenciam instantes felizes de propriedade exclusiva do casal. Na promessa, os nubentes dão ênfase ao amor. Cá entre nós, mas se forem somente frases lançadas ao vento? Impossível! O sentimento chamado amor não se resume a palavras.
O amor se faz presente nas ações espontâneos, em achados inesperados, na beleza da doação mútua, ao se entregar sem cobranças, no prazer de dividir e na felicidade de compartilhar. São manifestações que nunca deixarão a união entre casais que se amam verdadeiramente, perder-se no limbo.
Aqui abro um parêntese. Laura e Manoel, meus pais, partilharam um casamento de 65 anos. Ambos tinham a mesma idade. Nesse período, certamente houve turbulências, porém, nada que desestruturasse o enlace. Meu pai morreu primeiro, minha mãe, sete meses depois, de saudade e solidão.
Nada nem ninguém conseguia afastá-la da lembrança do esposo. Em suas orações rogava ao companheiro que viesse buscá-la. No aniversário de um dos netos, ela, eufórica, revelou aos presentes uma cena contumaz no seu sono noturno:
Nos meus sonhos, Manoel aparece postado sob a sombra de uma árvore. Uma cerca nos separa. Ele acena em despedida e parte. Ontem foi diferente. Manoel, antes de se afastar, me chama para acompanhá-lo. A cerca estava arriada.
No mesmo dia, dona Laura faleceu por força de um infarto anunciado. Não suportou a ausência daquele a quem havia prometido ser fiel, respeitar e amar durante toda a sua existência. Na ótica de minha mãe, somente a morte iria juntá-los novamente. Este exemplo define ou não um amor verdadeiro? Fecho parêntese.
No meu entender, das promessas contidas no juramento matrimonial, a mais significativa é a conservação do respeito, da fidelidade e do amor durante a doença de um dos cônjuges. Porque, uma coisa é amar na saúde e na beleza; a outra, é querer bem na decrepitude e na feiura com a mesma intensidade.
Ninguém casa com a expectativa de separação na cabeça, embora supondo que o cotidiano embote o brilho da convivência a dois. Imperceptível, também, é o mecanismo sublime que interfere a favor da união do casal que se ama.
Expondo a um amigo minha teoria para casamentos duradouros, perguntei-lhe qual a receita para o seu relacionamento de meio século. Ele respondeu:
Tolerância, meu caro! Justificamos muitos dos atos que praticamos creditando-os a carências masculinas, sem atentarmos que as mulheres possuem necessidades assemelhadas às nossas. O segredo é esbanjar tolerância!
Acolhamos a voz da experiência. Tenho dito!
José Narcelio Marques Sousa – Engenheiro civil e escritor – [email protected]