NAQUELE DOMINGO – Flávia Arruda

NAQUELE DOMINGO – 

Naquele domingo eu senti o cheiro da poeira da discórdia entalar minhas narinas e poros. Meus pulmões ficaram paralisados pelo odor pesado e desagradável do caos que se instalava no meu ser. Aquele perfume de outrora havia se dissipado no ar e, durante dias, eu fiquei entristecida por não sentir mais seu cheiro.

Foi estranho, assim como foi no início, quando das primeiras inaladas dos aromas de sua alma. Sim a sua alma tem cheiro. A melhor fragrância que eu já senti. É o perfume que exala de uma alma pura e verdadeira, quando o frasco da paixão se permite destampar para outra alma sorver o melhor da sua essência.

Hoje… ah, hoje eu tive um maravilhoso encontro com o perfume que irradiou a minha manhã, ao caminhar solitária pelas ruas desertas da cidade, a caminho de casa, às cinco da manhã. Caminhava um pouco apressada pela praça central. Diminui os passos ao sentir que o ar exalava o cheiro que, há dias não sentia.  Parecia flutuar em busca da fumaça perfumada que invadia minha alma, senti-me tomada pela fragrância da sua alma.

O cheiro que eu senti exalava do âmago dos meus sentidos, em comunhão a minha saudade, deixando que, por alguns instantes, eu desfrutasse da alquimia das almas de dois corpos que, um dia, se fundiram num só. Foi um lindo e perfeito encontro de cheiros, sonhos e lembranças.

Pude desfrutar da purificação dos meus pulmões, que se encheram com a reserva, em pequenos frascos, do perfume que unge a minha pele e acalenta a minha alma, aconchegando meus pensamentos na fragrância suave e marcante de suas lembranças.

Já em casa, depois do banho, embriagada com seu cheiro, deitei-me um pouco, queria paralisar o tempo e registrar todos os sentidos aflorados pela exuberância do seu cheiro. Queria desfrutar das provocações inaladas e sugadas do aroma afrodisíaco que me possuía.

Pude sentir outros cheiros, esses ainda mais adocicados, lembrando-me dos toques e carícias que fiz e senti nos mais íntimos momentos de nossos resguardos.

Meus sentimentos estavam encharcados com o néctar próprio do seu corpo; dos meus olhos derramaram-se saudades; senti sorver cada gota que jorrava do odre do amor, perfume que nos rasgou as vestes e nos embriagou com o perfume que permanece forte, presente em minhas lembranças e olfato.

Hoje eu descobri que alma tem cheiro, a sua alma tem o perfume do amor. Eu não teria como confundir o cheiro, se é único e primeiro, nesses longos anos de minha existência.

 

 

Flávia Arruda – Pedagoga e escritora

 

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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