NATAL, EU MENINO –
Ataulfo Alves canta “Eu daria tudo que pudesse, pra voltar os dias de criança”. Eu quase diria a mesma coisa, mas hoje tenho meus netinhos e não gostaria de viver sem eles. Mas, sempre é bom voltar ao passado, desde que este tenha sido bem vivido.
No meu tempo de menino, rapaz, Natal era diferente. Acordava-se pela manhã com os vendedores de cuscuz, tapioca e pão, aos domingos os sinos das igrejas badalavam anunciando as primeiras missas da manhã. Não tinha supermercados, as compras eram feitas nos mercados públicos. Existiam homens para carregá-las na cabeça, os chamados balaieiros, quase sempre um peso enorme. Fui moleque, ficava com outros colegas em cima do muro esperando o pobre homem passar, na hora exata empurrava com os pés o balaio, o homem caia com compra e tudo e nós partíamos na carreira. Não existia quase que piscina, tomar banho nos tanques da Praça Pedro Velho era um dos nossos divertimentos prediletos, mesmo correndo o risco de levar umas bordoadas de Humberto Pacheco, que era o administrador da Praça. Hoje onde é o Ginásio Djalma Maranhão existia um bar “O Zepelim” e criança só tomava refrigerante, pois Humberto não permitia que se vendesse bebida alcoólica a menores de dezoito anos. Peladas nos quintais das casas, de Valdir Vilar, Dante de Melo Lima, da professora Olindina Gomes, onde seu filho Eduardo (meu grande amigo) era o ídolo e conhecido pelo apelido de “Demônio Negro”. Peladas no meio das ruas Mossoró, Rodrigues Alves, Afonso Pena.
Existiam figuras populares que se tornavam conhecidas de toda a população. Os vendedores de jornais, Cambraia um morenão que vendia jornal cantando coisas que ninguém entendia Alberis que gritava as manchetes mais impossíveis da época. Um cidadão que ficava puto da vida quando passava e alguém gritava – Caju cadê a castanha? Vocês imaginem já o lugar que o cidadão dizia estar à castanha. Maria Mula Manca, uma pobre coitada que andava curvada, apoiada em uma espécie de cajado e fica furiosa quando alguém lhe xingava ou chamava pelo apelido de Mula Manca, mas era uma mulher de palavra. Disse certa vez, se Aluízio Alves fosse governador do estado ela iria embora e jamais voltaria ao Rio Grande do Norte e assim foi feito. Queria eu, que muitos políticos tivessem pelos menos metade da sua palavra. Até veado era coisa rara e eram conhecidos de todos. Não divulgo nomes ou apelidos, porque ainda hoje tem muita gente boa se passando por macho.
O esporte amador era prestigiado por toda sociedade, o Ginásio Silvio Pedrosa ficava lotado, principalmente para os jogos de basquete e futebol de salão, onde o Rio Grande do Norte disputava com o Ceará e Pernambuco a hegemonia do Nordeste. Futebol de campo era no velho Juvenal Lamartine, onde se criou a famosa frasqueira do ABC.
Às noites eram curtidas no Grande Ponto, nos bares e cabarés da cidade. Maria Boa era o mais famoso, mais existiam outros bem freqüentados, Night and Day, Ideal, Boate Paris, Alabama, Francesinha, Otávio, Rosa de Ouro e outros. Os bares eram simples, mas acolhedores. A Tenda do Cigano, Postinho, È Nosso, Dia e Noite, Café Nice, Pitombeira, Briza Del Mare, A Palhoça, Iara Bar, Nemésio, Confeitaria Cisne, Acácia Bar, Escondidinho, Confeitaria Atheneu, entre outros.
No domingo o divertimento era ir às praias, aos cinemas Rex, Nordeste e Rio Grande e depois as matinês do ABC na Rua Afonso Pena onde hoje é o C.C.A.B. e América na Rua Maxaranguape.
Praias Chiques era Areia Preta, Praia do Forte e Miami Beach, urbanas. Ponta Negra era praia de veraneio Juntamente com a Redinha. Não existiam motéis, e os “abates” eram feitos na praia do Forte e Capim Macio.
Lembro-me da festa do Caju, no Redinha Clube, festa animadíssima e prestigiada por toda sociedade. Tinha as travessias do rio Potengi, feita a barco ou na lancha a motor de Luis Romão. Era tempo de serenatas feitas por Dozinho, José Luiz leal, Gil Barbosa, Marcio Marinho, Eimar Vilar, Airton Ramalho, Cezimar Borges, Salvador Galego, Guaraci Picado e pra turma uma coisinha na frente Edílson Fonsêca. Época em que íamos esperar as saídas dos colégios. A Escola Doméstica aos domingos (por conta do internato), Colégio da Conceição, Neves e Atheneu eram os mais destacados.
Namoro era pega na mão e até as vinte e três horas (já com os descontos). Tempos das quermesses, me lembra a lagoa Manoel Felipe e Evaldo Maia era o papa para organizar tais eventos. Festas nas praças (da mocidade) e outras, pastoris, o carnaval era o corso na Avenida Deodoro, havia blocos que iam as casas das famílias para alegrar. Xamêgo, Peraltas, Sambalanço, Jardim de Infância, Cafajestes e outros. Missa campal de Natal a meia noite em frente às Igrejas. Ate a corrida de São Silvestre (Preliminar) empolgava e o nosso querido Tota Zerôncio sagrou-se campeão correndo apenas os trinta metros finais.
Era outro Natal, mas com certeza os que viverem como nós vivemos irão contar historias, porque graças a Deus vivemos bem com Natal.
Guga Coelho Leal – Engenheiro e escritor, membro do IHGRN
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