NO TEMPO DO GRUPO ESCOLAR –

Não. Nem tente forçar a memória, meu jovem leitor, pois não é assunto de seu tempo de criança. O Grupo Escolar pertenceu a um tempo que parece não haver existido. Em que qualquer semelhança não teria sido mera coincidência, pelo simples fato de não guardar identidade alguma com a atualidade escolar do país.

O Grupo Escolar do qual falo era uma escola pública onde o aluno recebia o primeiro estágio da educação sem sofrer restrição de cor, credo ou patamar social. Onde estudavam na mesma sala filhos de empregado e empregador numa convivência salutar imposta pela contingência da limitação de opções para cursar o ensino básico.

Onde o professor era apenas professor e gostava de ensinar. Onde existia respeito mútuo entre o aluno e o mestre. Onde não cabia violência e sobrava satisfação naquele ambiente modesto de aprender e ensinar. Onde se obtinha noções de civilidade, patriotismo, religiosidade e respeito aos mais idosos. Onde surgia o coleguismo espontâneo e brotavam amizades sinceras e duradouras.

No Grupo Escolar a que me reporto não existia qualquer tipo de tecnologia digital ou analógica. O computador era uma caixa de madeira contendo lápis, borracha, apontador, caneta tinteiro, goma arábica, mata-borrão e régua de madeira. Guardava-se ali todo o material necessário para o preenchimento de páginas de cadernos de caligrafia, desenho, linguagem e a tabuada – complemento usado para a familiarização com a aritmética.

No último ano da grade curricular do Grupo Escolar o aluno prestava exame admissional para frequentar o ginasial. O primeiro vestibular. A primeira grande alegria e início de outras tantas superações na vida estudantil.

Durante a permanência no Grupo Escolar, o estudante considerava a escola o templo sagrado do ensino, e via no professor, o sumo sacerdote do conhecimento. Daí o respeito, que beirava o fanatismo, pela instituição que lhe oferecia sabedoria gratuita. Na rotina da escola, o aluno apresentava-se enfatiotado numa farda limpa e engomada, e com o único par de sapatos bem engraxado.

Nem sempre terminava a jornada diária com a mesma compostura que entrara na sala de aula, mas isso não importava. A pasta de couro, herança do irmão mais velho, representava o toque de vaidade no perfil do jovem estudante do Grupo Escolar.

Concluído o estágio de quatro anos do primário descortinava-se, aos olhos do aluno, um mundo encantado de novas informações. Ei-lo diante de livros como o “Estudo Dirigido de Português” de Reinaldo Mathias Ferreira, da “História do Brasil” de Hadock Lobo, da “Geografia do Brasil” de Aroldo de Azevedo, das “Ciências Naturais” de José Coimbra Duarte, da “História Geral” de Joaquim Silva, da “Matemática” de Osvaldo Sangiorgi e do “Spoken English” de João Fonseca.

A essa gama de novidades aliavam-se aulas de “Canto Orfeônico”, “Religião”, “Educação Moral e Cívica” e “Estudos Sociais”. Não existia Google, mas as enciclopédias supriam a curiosidade de estudantes mais abastados, em busca de informações privilegiadas.

Esse foi o inesquecível retrato de uma época. Nem pensar em inserir aquelas técnicas barrocas ao ensino da atualidade. Até porque vivenciamos dias de avanços inimagináveis requerendo métodos específicos de aprendizado. Absorver aspectos didáticos de ontem seria apenas retroceder no tempo e no espaço sem nada contabilizar de positivo. Mas, no que concerne a determinados valores morais e posturas comportamentais, ah meu caro leitor, estamos anos-luz atrás daquilo que se praticava no século passado.

 

 

 

José Narcelio Marques Sousa – engenheiro civil

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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