O grande desafio, Senhor Redator, nesses tempos de hoje, dedicados ao sonho de um novo modelo de governança, é definir o que é o novo. Separar o joio abundante do trigo desejado. É não cair naquele novo, falso e enganador, filho bastardo da novidade. O novo há de ser uma ousadia fiel aos compromissos assumidos. Sejam antigos ou modernos, pois o novo será sempre o que for justo e ético nesses tempos de políticos destituídos do espírito público, qualidade realmente indispensável.
O que pode ser novo no exercício do governo diante de deveres tão antigos, como a garantia de saúde, educação e segurança, paz e chances de prosperidade para todos? O que é ser novo, se antes de tudo governar é promover o bem estar individual e coletivo, o que de resto, convenhamos, não tem a menor novidade? A mania de ser moderno pode ser uma síndrome se antes do marketing não brotar a força da consciência do bem nesse maniqueísmo inevitável e eterno da luta do bem contra o mal.
Um líder pode até prescindir de uma boa formação intelectual, ser fruto de sua capacidade de observação e absorção dos saberes indispensáveis ao exercício do governo. Pode e deve ter um tanto de esperteza, outro de matreirice, mas não pode dispensar o espírito público e espelhar na serenidade o timbre de sua maturidade. Os governados até compreendem nos auxiliares e acólitos o açodamento de um gesto nascido da servidão, mas do líder os liderados sempre aguardam o gesto justo e devido.
O eleito, afastadas as grandezas e misérias da condição humana, inerentes a todas as pessoas, foi o melhor naquela hora e sob aquelas circunstâncias. É dele que os governados esperam receber o benefício público, afinal nas democracias o Estado é menor e menos importante do que a Nação. Há de vir de quem governa, pois, esse sentimento de respeito à soberania da vontade popular. Sem essa vontade não há eleito, e, se houver, viverá no poder as agruras da mais triste e fria solidão humana.
Para quem governa nada pode ter relevância maior que o gesto de promover o bem de todos. O ciúme dos aliados e o rancor dos adversários serão sempre sentimentos menores diante da dor e do medo que assaltam o cidadão, tenha ele votado nesse ou naquele candidato. Essa conta degrada muito mais a quem a faz, parcela a parcela, do que a quem paga o preço da soma. Ora, Senhor Redator, se o eleito foi eleito por ser o melhor de todos naquela hora, como compreendê-lo como símbolo do pior?
Quem governa tem o dever inalienável de manter aberto o diálogo com seus governados. Sem intermediários que sirvam ao poder e não ao povo. Por mais utópica que venha a ser a democracia grega, ninguém soube fazê-la melhor. Nem as mais poderosas economias do mundo conseguiram substituir a força do voto pelo poder dos mísseis e suas casamatas nos campos de guerra. O grito da multidão derruba um governo, Senhor Redator. Mesmo cercado de seus soldados por todos os lados.
Vicente Serejo – Jornalista e Escritor