O ANTIQUÁRIO –
Noite com lua, céu bonito, poucas nuvens, a janela do meu quarto servindo de tela para este bonito cenário. Pensei nas coisas da vida, pensei e tentei indagar porque nascemos bons e nos tornamos maus, por que tanta ambição e tanta maldade na criatura que deveria ser a mais perfeita do nosso mundo vivo. Pensei em Deus, pedi para ele aliviar a minha tristeza, então procurei dormi, sonhei. Sonhei que estava sentado no jardim de minha casa, aparecia um senhor de cabeça muito branca, barba branca, todo vestido de branco e disse-me – Vou acabar com sua tristeza, vamos viajar. Estirou-me a mão, eu a apertei e de repente entrei em um redemoinho de vento. Paramos em uma casa branca, janelas e portas azuis, toda alpendrada, piso de tijolo branco, encravada em um terreno cheio de fruteiras, com cômodos muito espaçosos. Notei que tinha uma placa “Morada da sexta felicidade.” Eu usava calças boca de sino, vi a nota de compra: Lojas Seta, no rodapé a propaganda. “Lojas Seta para homens. Famosas por venderem barato”, camisa de manga curta quadriculada, comprada na Formosa Syria, sapatos vulcabrás comprado na Sapataria Elite, meias finas de nylon e um suspensório, comprados na Loja Tic-Tac.
O senhor que me servia de guia, disse-me – Agora vamos entrar e vamos ver o que tem nesta casa, você certamente se sentirá muito feliz. Na primeira sala, tinha uma mesa com uma senhora engomando com ferro a carvão e abanador de palhas das folhas da carnaúba. Ao lado na outra sala uma radiola, um móvel em que tinha o toca discos e radio juntos, onde ouvíamos os velhos long-plays, discos de vinil, enormes, com 20 centímetros de diâmetro aproximadamente, das velhas gravadoras RCA e Columbia, as mais conhecidas. Tinha discos dos Beatles, Elvis Presley, Paul Anka, Jorge Goulart, Nelson Gonçalves, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Cely Campelo, Rita Pavoni e outros. A radiola foi comprada nas lojas de Gumercindo Saraiva, MusiSom, e as cadeiras da sala, nas Lojas Leonel Monteiro. Para iluminar eram usados os candeeiros ou lampiões a querosene. Ao lado do portal de madeira que separava as duas salas, um telefone preto fixo na parede, onde tinha um disco com números de zero a nove e girava quando fazíamos a ligação. No centro da sala um relógio a corda, de parede, de pêndulos, da marca Zaance, mais adiante a cozinha, uma geladeira General Eletric, com fogão a carvão, substituindo o antigo de alvenaria, que era a lenha, mas ainda estava no lugar. A torneira da pia foi comprada no “O Limarujo” de propriedade de Seu Limarujo.
Fomos até o pátio, lá encontramos duas motos da marca Lambretta e Vespa e junto os retratos dos amigos Klauss Nóbrega e Veca Brun, já falecidos, amigos de infância e fãs deste tipo de transporte. Em frente meus amigos Pedro Cavalcanti e Dudu, mostrando alguns carros: Studebcker, Dodge, Mercury, Gordine, Dauphine, DKW, Rural Willys, Jeep Willys, Simca, Aero Willys, Karmann Ghia. Na parede uma placa de financiamento desses veículos, pelo Bancaldo, estabelecimento de crédito do Sr. Aldo Fernandes.
Caminhamos mais e encontramos uma lanchonete com o nome “Dia e Noite”, um garçom cujo apelido era Gasolina. Lá servia milk shak, torradas, bauru, cartolas e outros, também a goiabada Ceci, feita na indústria Orlando Gadelha Simas e Irmãos. Adiante olhei e vi um anãozinho vendendo balas e chicletes, dropes etc., perguntei quem era, fui informado que ali era o Cinema e que o anão era Manoelzinho, vi um senhor muito parecido com o doutor João Rabelo, perguntei de novo e me disseram que era Odemar Guilherme gerente, que estava orientando o pintor Vilinha a pintar os cartazes que eram colocados nos postes anunciando os filmes. Lá tinha anúncios de filmes de Alfred Hitchcock, Carlos Ponti, Frederico Fellini, Stanley Kubrick, retratos de artistas como Oscarito, Grande Otelo, Ankito, Zezé Macedo, Mario Moreno (Cantinflas), James Dean, Clark Gable, Marilyn Monroe, Marlon Brando, Anthony Perkins, Charlie Chaplin e muito outros.
Já na saída ouvi uma musica baixinha. “Estrelas das Américas no céu azul/Iluminando de Norte ao Sul/Mensagem de amor e paz/Nasceu Jesus chegou Natal/Papai Noel voando a jato pelo céu/Trazendo um Natal de felicidades/E um Ano Novo cheio de prosperidade/ Varig, Varig, Varig. Fui comprar coma de mascar na Confeitaria Mirim, do amigo João da Mirim.
Acordei feliz pensando naquele sonho, fui tomar banho, quando chego ao banheiro tinha um folder “LIFEBUOY É SABONETE DESODORANTE E SABONETE SE USA NO CORPO INTEIRO”. Olhei com espanto e sorri, agradecendo a Deus mais um dia vivido e por ele sempre está comigo.
Guga Coelho Leal – Engenheiro e escritor, membro do IHGRN