O APOSENTADO –
Alexandrino, professor aposentado, tinha horror à velhice, e não dizia sua idade, “nem a pau”.
A quem lhe perguntasse quantos anos tinha, respondia em cima da bucha: “Sou do tempo da civilidade, quando era falta de educação se perguntar a idade”.
Na verdade, o homem já beirava os setenta anos, assim como quase todos os seus amigos de prosa, com quem se reunia todas as tardes.
Sentindo que a velhice estava chegando, o aposentado começou a ter sonhos eróticos, passando a alimentar o desejo de ir para a cama com uma mulher bonita, fogosa e de carne dura, como tantas vezes fizera no seu tempo de rapaz. Ele não aceitava o fato de ser idoso.
Há quarenta anos, apaixonou-se por Rosalinda, com quem se casou e constituiu família. Entretanto, a rotina, a maior responsável pelo fim dos relacionamentos, logo transformou a paixão em fogo de palha. O amor que uniu o casal, há anos, havia sumido, no tempo e no espaço.
Muito bom de cama, Alexandrino dormia maravilhosamente e roncava muito, ao lado de Rosalinda. Assim eram suas noites. A sua frustração, ao acordar todas as manhãs, era grande. Passava a noite sonhando com outras mulheres e logo cedo despertava, ao lado da esposa sessentona, xexelenta e flácida da cabeça aos pés. No entanto, esquecia de que ele, também, já não tinha 24 anos.
No íntimo, quando via a esposa ao seu lado, a vontade que tinha era de lhe dar uma piza. Mas vontade dá e passa… Jamais, faria isso. Sempre dizia que numa mulher, não se bate nem com uma flor.
A diferença de idade entre o casal era somente de dois anos.
Certo dia, morreu uma cunhada de Rosalinda, e ele, como bom marido que era, comprou-lhe passagem de avião para ir ao Rio de Janeiro, assistir aos funerais. Por economia, não acompanhou a mulher.
Ao se ver sozinho, Alexandrino foi se encontrar com os amigos e manifestou sua vontade de fazer uma farra. Afinal, esse sonho ele há muito tempo alimentava, mas não tinha coragem de pôr em prática. Considerava-se um preso, em prisão domiciliar. Só faltavam as tornozeleiras. Era dominado por Rosalinda, e não tinha voz altiva pra nada. A mulher era uma jararaca.
Mas, agora, seu desejo iria se realizar. Por essa chance, ele não esperava. Por isso, não podia desperdiçá-la. Dessa vez, iria matar sua vontade de ir pra cama com uma das mulheres lindas, que povoavam os seus sonhos.
No “clube” em que a turma foi se reunir, havia mulheres para todos os gostos.
O aposentado sentiu-se atraído por uma bela morena, e com ela seguiu para uma suíte. Até que enfim, iria matar o seu desejo de ter nos braços uma mulher jovem, bonita e gostosa, e reviver sua juventude.
Depois de horas de amor, exausto, Alexandrino adormeceu. A “mariposa”, acostumada a grandes noitadas, aproveitou o seu sono profundo, retornou ao salão, e continuou se divertindo e bebendo. Quando o dia estava amanhecendo, muito embriagada, voltou à suíte e deitou-se junto do cliente.
O homem, ainda sonolento, acordou assustado, pensando que estava em sua casa, ao lado de Rosalinda. Mas, de imediato, veio-lhe à mente a noite de amor que tivera com uma mulher linda e gostosa, uma verdadeira artista na cama. Procurou a beldade e ficou paralisado. Ao seu lado, estava um travesti sem peruca, exageradamente pintado e completamente nu. Uma figura dantesca, que lhe provocou um terrível mal-estar. Ao vê-lo passando mal, a “moça” fugiu da suíte, correndo, à procura de socorro.
O SAMU veio buscar Alexandrino, que estava desfalecido. O idoso sofreu um AVC, que lhe deixou sequelas para o resto da vida.
Rosalinda nunca soube dessa estripulia do marido. Soube, apenas, que ele se sentiu mal, em casa mesmo.
Violante Pimentel – Escritora