O BRASIL JÁ TEVE UM REINO E (AINDA TEMOS, NO RIO) UMA BIBLIOTECA REAL –

O antigo reino estabeleceu-se nas páginas da história do Brasil, já o Real Gabinete Português de Leitura ficou para o deleite dos leitores e da árvore do conhecimento que tantos buscam alcançar.

A construção esmerada do edifício durou de 1808 a 1887, abertura ainda no Império. Em 2014 foi eleita como a quarta biblioteca mais bonita do mundo, privilegiada distinção em uma atmosfera mágica para quem adentra os salões preservados com extremo zelo. A magnitude da fachada inspirada no grandioso Mosteiro dos Jerônimos, em Lisboa, aqui ajaezada com pedras trazidas de navio de Portugal para o Rio a partir de 1808, com a vinda da Corte de D. João VI, antes da invasão napoleônica.

O endereço sugestivo à Rua Luiz de Camões número 30, entre obras raras do acervo magnífico, é possível ter a vista um exemplar da primeira edição de Os Lusíadas (publicado em 1572), obra prima camoniana do Renascimento ibérico. Para o regalo de ávidos pesquisadores há estantes em que lá estão livros portugueses do século XVI, com primeiras descritivas de nossa terra já entrada na era moderna (dita) civilizatória.

Na primeira década do século XX, um nobre frequentador das bancadas do Real Gabinete, Joaquim Maria Machado de Assis, inspirava-se – como relatou em crônica de A Semana – o ambiente ideal para ele, em que se respirava a arte da escrita, história e poesia. Personalidades das letras desse tempo áureo poetas e romancistas brasílicos eram vistas assentadas nas mesas da Real instituição, a mencionar o escritor Euclides da Cunha, o senador Rui Barbosa, o cronista João do Rio, o poeta Olavo Bilac. Dentre os volumes da Biblioteca estão manuscritos relevantes, dentre eles a comédia de Machado ‘Tu, só tu, puro amor’. Naturalmente nem todas as obras podem ser acessadas de forma direta, há um rito afeito a entidades congêneres, que atende aos investigadores e especialistas para que façam suas minudentes pesquisas nas obras raras.

A acrescentar que as cinco primeiras sessões da então fundada Academia Brasileira de Letras, tendo um dos prógonos o próprio Machado de Assis, foram realizadas no Real Gabinete. A admiração registrada em Livro por ilustres visitantes estrangeiros ao conhecer o riquíssimo acervo de obras portuguesas, a mais qualitativa e extensa fora de Portugal. A beleza estética na arquitetura secular ofereceu a excelência ao cenário para reuniões do quilate da ABL e outras de relevância literária e científica.

Na acurada presidência e curatela da nobre e longeva instituição está o Dr. Francisco Gomes da Costa, que consegue, com maestria, modernizar e suster a perfeição da obra maior do Real Gabinete, que é composto propriamente do edifício centenário e do acervo primoroso.

E me veio a surpresa ontem. Um fraterno amigo e leitor, advogado da AGU, Dr. Paulo Borges, para minha subida alegria, alertou-me que nosso modesto ensaio sobre a Coluna Prestes e o Cangaço está presente na prateleira do Real Gabinete. A recordar que meu saudoso pai, comerciante português, tinha uma caderneta de frequentador, eu me recordo das idas aos monumentais salões da Biblioteca à Rua Luiz de Camões.

Este texto, inspirado pela lembrança da data rememorativa de nascimento de Machado de Assis, 21 de junho, tem a reviver a esperança por dias melhores para os brasileiros, para que possam galgar ainda mais as luzes do saber pela leitura, pois sem a leitura, sempre a citar, apagam-se os estímulos por uma consciência livre e crítica.

Neste tempo de gravíssima pandemia, um desafio para nosso tempo, os leitores podem acessar o acervo do Real Gabinete, pelo link https://www.realgabinete.com.br/#Biblioteca.

De igual modo que esta lembrança conceba mais um admirador e mais um membro de consulta do acervo do Real Gabinete de Leitura, digníssimo presente do antigo reino para os leitores brasileiros.

 

 

 

Luiz Serra – Professor e escritor
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