O DENTE DE ANTES E O DENTE DE HOJE –
Acordo e pergunto ao mano Jorge – o Tiradentes da família, se posso caminhar. Com o sim e apenas uma recomendação de gelo na boca, parto para meu porto preferido, a orla de Ponta Negra.
Não precisei dar muitos passos para a mente começar seu processo reflexivo que recaiu justo sobre o dente expulso pelo mano.
No jogo do lembrar como era o arrancamento ao tempo do meu saudoso pai – dentista de boa cepa local, lembro que era com alicate. A anestesia vinha através de agulhas mais grossas e a dor era mais presente. O esforço para arrancar o dente dava a entender que o cirurgião dentista precisava também de força física. As vezes a posição passava por uns contorcionismos apavorantes que deixavam assombro para funerais de futuros dentes.
Hoje arrancar dente é um passatempo divertido. A agulha é tão fina que nem sentimos sua penetracão. Uma picada de muriçoca causa muito mais estrago. A extração é mais fácil e sem muitos atos para lá e para cá. Um empurrão lateral de pouco esforço e puft, lá estava o dente fora do seu lar.
Ato contínuo a gengiva deu tchau e livre festejou de maneira chinesa soltando um raso rio de sangue rapidamente controlado.
Um fio magistralmente conduzido teceu amarras entre partes de carnes soltas, não dando tempo para que curtíssem a liberdade de estar sem aquela peça ali residente. Ao fim do subir, perpassar e alinhavar, as partes se uniram pela força dos pontos e toparam sob o jugo do competente profissional, o fluir das hemácias em direção às cavernas bucais, consolidando o ato e decretando o the end do propósito ao qual nos submetemos.
Por fim, com a boca subtraída de um velho companheiro de pouco mais de 50 anos, com relevantes serviços prestados nas áreas de trituração, amassamanento e produção final de alimentos para engolimento, pude me despedir a agradecer a tão importante e valoroso companheiro de tantas jornadas.
E a mente despertou das reminiscências das extrações do ontem com papai, e do hoje com o mano Jorge, ficando agradecida e feliz aos profissionais pelo talento e ao dente ido pelo que foi ao longo de tanto tempo comigo.
E a caminhada prosseguiu com Hendrix na guitarra e Floyd na moderna vitrola dissolvida modernamente no meu smartphone Samsung.
Eita vida boa da gota. Andar, recordar e agradecer sempre. Agora é mergulhar no mar e comer uma comidinha vegetariana na Samosaria Hare, pegando de leve na livre gengiva, para que ela sem agressão não volte a produzir o rio vermelho em minha boca menos dentada, mas sempre muito amada
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