O DESVIO DO POSTO IPIRANGA –
Nos anos 1970 se iniciou, por quase todo o mundo, uma ação de redução da intervenção do Estado na economia e de liberdade das pessoas. Na Grã-Bretanha, a Primeira-ministra Margaret Thatcher vendeu a participação que o governo britânico mantinha de algumas empresas, cortou gastos públicos, proibiu o aumento dos preços dos serviços governamentais e enfrentou o poder dos sindicatos. Resultou na redução da inflação e, por um período inicial, no crescimento da taxa de desemprego. Politicamente teve uma ação drástica contra as esquerdas locais e combateu duramente os países de governo comunista. Em 160 anos, foi o único primeiro-ministro a permanecer no cargo por três mandados consecutivos e, ainda, elegeu seu substituto, John Major, do seu partido, o Conservador. Major exerceu as funções por sete anos, cedendo o lugar para um membro do Partido Trabalhista, de esquerda, Tony Blair, que, curiosamente, manteve a política liberal de Margaret Thatcher inalterada em seus princípios básicos.
Nos Estados Unidos, Ronald Reagan, do Partido Republicano, assumiu o poder em 1981, caracterizando seu governo por uma condução liberal na economia, por um enfrentamento constante com a União Soviética. O seu sucessor, George Bush, do mesmo partido, manteve a política econômica. Em 1993, com a retomada do poder pelo democrata Bill Clinton, o liberalismo econômico afirmou-se mais ainda nos Estados Unidos, obtendo uma baixa taxa de desemprego, ao mesmo tempo em que sua economia apresentou uma das maiores taxas de crescimento.
Porém o fato mais espetacular ocorreu na antiga União Soviética, quando, em março de 1985, o poder foi transferido para uma nova geração de políticos, liderada por Mikhail Gorbachev, que introduziu uma série de reformas. Liberou os agricultores e os gestores das fábricas da interferência burocrática do Estado e fomentou um “mercado socialista”. A partir de 1987, Gorbachev imprimiu uma dinâmica maior na reestruturação da economia e da política interna. Essas reformas – os mais radicais e fundamentais reordenamentos da política soviética – foram feitas em nome de uma chamada “democracia socialista”, que seria um sistema econômico misto. Seu resultado foi inesperado: em 1989 caíram os regimes comunistas na Polônia, Checoslováquia e Romênia.
Em 19 de agosto de 1991, houve uma tentativa de golpe de estado, resultado de uma aliança entre líderes do Partido Comunista, membros da KGB (polícia secreta) e das forças armadas. Foi o começo do fim. A dissolução formal da URSS ocorreu no dia 25 de dezembro do mesmo ano. O desmoronamento da segunda potência mundial foi melancólico.
Em 1982, a China, adotou uma nova Constituição, com incentivo à “economia de mercado” e fomentou o comércio externo e os investimentos estrangeiros. Como resultado hoje é a segunda potência econômica do planeta.
No Brasil houve uma tentativa de um liberalismo econômico “possível”, no governo de Castelo Branco (o primeiro dos presidentes militares). Porém liberalismo não se conjuga com ditadura. Somente no governo Collor-Itamar é que o processo foi retomado, com a abertura do mercado externo e a privatização de algumas empresas estatais. Foi na administração de Fernando Henrique Cardoso que o processo realmente se sedimentou, acompanhado de propostas de modernização e reformas do Estado, bem como da contenção definitiva da inflação.
A pergunta que fica: o que é liberalismo? Em síntese: é um conceito teórico, representado pelo conjunto de ideias e doutrinas, que visam assegurar à pessoa humana o direito à liberdade econômica e política – de forma individual – no campo da economia, da política, da moral, da religião etc., dentro da sociedade. O liberalismo econômico prega a livre concorrência e a não intervenção do Estado. Por sua vez, o liberalismo político visa estabelecer a liberdade política do indivíduo em relação ao Estado e preconiza oportunidades iguais para todos. Pena que o Posto Ipiranga tenha se afastado do que apregoava ser.
PS: Para se informar mais, leia o livro de minha autoria “Para Aprender Economia”.
Publicado originalmente em Tribuna do Norte. Natal, 21 jul. 2021
Tomislav R. Femenick – Mestre em Economia pela PUC-SP e historiador