O ÉPICO NO RN E SEU ARTISTA –
Desconfio que nenhum outro Estado tenha vivido acontecimentos épicos semelhantes ao nosso Rio Grande.
Como esquecer os feitos heroicos de Clara Camarão? Ela foi a primeira heroína nacional, formou, na sua tribo, um batalhão de mulheres para ajudar o marido, Felipe Camarão, na expulsão dos invasores holandeses.
Sem paralelo, por motivação religiosa, vivemos a tragédia. A matança nos povoados de Cunhaú (que, em tupi, significa águas de mulher) e Uruaçu (que quer dizer grande pássaro) resultou na canonização de mártires pela Igreja de Roma. O Rio Grande do Norte ofereceu trinta santos ao Brasil. O morticínio dos católicos foi conduzido pelo alemão Jacob Rabbi à frente de índios Janduís, aliados dos huguenotes holandeses. Ao final, um macabro banquete antropofágico.
Nas lides cangaceiras, louvado pelo cordel, Jesuíno Brilhante é lembrado como o Robin Hood nordestino.
De relevo é a saga de frei Miguelinho, que deu a vida pela liberdade do nosso país.
Entre nós, Mossoró é a cidade heroica que enfrentou e venceu Lampião e os seus perigosos facínoras. Lampião, vencedor em cinco Estados nordestinos, tornou-se o rei dos cangaceiros. O seu chapéu estrelado, com pingentes de ouro, era a sua coroa. Qual Macbeth, ele acreditava em bruxas e também que tinha o corpo fechado. Difundia o medo pelo sertão a partir das cidades invadidas. Já aparecia gente para louvar a sua coragem e sua ética torta. Cometeu um erro. Exigiu submissão, dinheiro, sob pena de invadir Mossoró.
O povo, normalmente pacífico e acolhedor, enfrentou a corja marginal. E venceu. O bandido “Colchete” foi morto e o aterrorizante Jararaca ferido e depois morto. O restante fugiu.
Dorian identificou-se à Cidade da Resistência e perpetuou o seu feito.
O gênero épico, semeado pelo grego Homero, o latino Virgílio, o toscano Dante (sem heróis) e o português Luiz de Camões, não alcançou o nível tentado e somente alcançado pelos sublimes.
Os acontecimentos estaduais foram representados por Dorian Gray. A inovação inicia-se pela perfeita integração entre o poema e a pintura.
Vale a pena conhecer a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. No salão de entrada, o artista registra em um pórtico, integrando painéis sobre um único tema: Frei Miguelinho. O seu livro “Canto Heroico – Arte & Texto” celebra a vida e a morte do libertário mártir.
O historiador de arte Franco Maria Jasiello não hesita em compará-lo aos grandes mestres universais: “É confortador e exaltante reencontrar no políptico de frei Miguelinho a determinação de Memling, o equilíbrio de Simone Martine, a impetuosidade de Nuno Gonçalves, o inusitado Masaccio, a audácia de Giotto, a polêmica de Picasso, porque é outro aspecto do artista Dorian Gray, o do pesquisador, do observador atento”.
Essas sagas devem ser contadas em cada escola, em cada sala, como recomendava o poeta-autor.
Diogenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN
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