O PASSADO –
Sinto-me bem quando volto ao passado (na imaginação), faço um exercício mental grande e me concentro nessa viagem de volta aos tempos da infância, da juventude.
Na casa dos meus pais, tinha na frente, uns batentes e dois pequenos muros de contenção em forma de ponto de interrogação onde a noite eu me sentava e ficava pensando nas coisas da vida. Agora sessenta anos depois repeti a experiência, não nos batentes da Rua Mossoró, mas em uma mureta da minha casa, na Múcio Galvão.
Á tardinha, voltei ao passado, e de repente, estava ali sentado em um dos pontos de interrogação vendo passar, o cuscuzeiro vendendo logo cedinho ”Cuscuz da Mata”. Um pouco depois passava o vendedor de tapioca anunciando tapioca molhada com coco, não demorava muito passava o vendedor de pão carregando um grande depósito nas costas com pão de vários tipos, frances, crioulo, carteira, pão doce, de cachorro quente. Assim era o inicio do dia. Mas tarde, lá pras oito horas da manhã passava o verdureiro vendendo verduras em uma carroça. Não passava muito tempo vinha o garrafeiro que comprava garrafas, jornais, revistas e ferros velhos, e o amolador de facas e tesouras. Passavam ainda os balaieiros que vinham do mercado grande da Cidade Alta. À noite ou à tardinha na companhia dos vaga-lumes, voltavam quase todos, e ainda, as lavadeiras que lavavam as roupas no Riacho do Baldo e os vendedores de jornais. Entre estes, me. lembro bem de dois – Cambraia um moreno de cabelos branco que vendia os jornais em uma cantarola que eu não entendia nada, o outro conhecido por Alberís que anunciava as manchetes mais absurdas possíveis para vender os jornais – A mulher que engoliu um trem. Os guardas noturnos passavam a noite toda se comunicando através de apitos.
Domingo missa na Matriz. Aproximadamente as 4,30h, em todas as manhas dos domingos (não existiam missas à noite e nem aos sábados) começavam os toques dos sinos das igrejas convidando os fieis para as missas, geralmente às seis horas, (algumas as cinco), íamos acompanhado de um missal e de um terço. Um pouco mais tarde o divertimento era à praia, As favoritas, do Forte, do Meio e Areia Preta, já que Ponta Negra e Redinha eram praias de veraneio. Para chegarmos a Redinha, íamos pela ponte velha ferroviária ou nos barcos a vela e lanchas de Luiz Romão. Lembro-me de alguns timoneiros, Janjão, Gonzaga, Ferrinho. À tarde dos domingos era nos cinemas Rex, Nordeste, Rio Grande, Poti e São Luiz, vindo depois o Cine Panorama nas Rocas. Falar em Rocas existia por lá três restaurantes muito simples, mas muito frequentados, Peixada da Comadre, as Carne de sol do Lira e do Marinho, depois a Galinha de Mãe, de Chico, que era garçom no bar e restaurante A Palhoça. Tinha também os jogos no Juvenal Lamartine que dia de clássico lotava. Os mais pobres assistiam em cima do morro que fica atrás do velho estádio. O papo no Grande Ponto que ficava na Rua João Pessoa.
O comércio de Natal era divido em três bairros, Ribeira, Cidade Alta e Alecrim. Na Ribeira tinha postos de gasolina, lojas de ferragens, lojas de venda de veículos, implementos agrícolas e materiais de construção, material esportivo. Lembro-me de Galvão Mesquita, Limarujo, MM costa, Santos e Cia. J.L. Fonseca, Comercial José Lucena, Ciro Cavalcanti, Armazém Paraibano, as casas dos Lamas, entre outras. Na Cidade Alta ficavam as lojas de roupas, eletros domésticos e armazéns de estivas e cereais. A Formosa Síria, Casa das Máquinas, Sapatarias Elite e Monteiro, Lojas Seta, Casa Rio. Tic-Tac, Duas Américas e outras. No Alecrim era uma mistura desses comércios, sendo mais popular.
Nas festas natalinas, o comércio da Cidade Alta abria a noite e todos iam passear prosar ou namorar no retângulo formado entre as Ruas Rio Branco, Deodoro, João Pessoa e Ulisses Caldas. Os carros antigos muito simples, mas que me traz muitas saudades: Rural Willys, Aero Willys, Sinca Chambord, Kharman Guia, DKW, Dauphine, Gordine e o velho Fusca que ainda resiste ao tempo.
Definiu Albert Einstein “A distinção entre passado, presente e futuro é apenas uma ilusão teimosamente persistente”.
Guga Coelho Leal – Engenheiro e escritor, membro do IHGRN
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