O RANGER DAS RODAS DO CARRO DE BOI –

Dias atrás na expectativa de cumprir agenda de trabalho, visitei cidadezinha do sertão alagoano, lá chegando pouco antes do horário, então aproveitando a sombra de um pé de tamarindo passei a espiar o ambiente, quando de repente escutei um barulho peculiar que marcou minha infância lá em Caicó, o gemer das rodas de um carro de boi.

Para mim, aquele barulho representava mais que um som, era melodia ancestral atravessando o tempo, trazendo consigo memórias, significados profundos e a simplicidade de uma época, marcando o compasso do cotidiano feito de trabalho, paciência e conexão com a natureza.

Foquei o olhar no movimento compassado de tal meio de transporte, e imaginei que o homem guiando e o boi que puxando, formavam uma dupla que me inspirava. O primeiro com mãos firmes orientava o caminho, enquanto o bovino, demonstrando força serena, suportava o peso da carga. Juntos enfrentavam sol, poeira e distância, representando a força e coragem de quem trabalha para construir um futuro melhor.

Em meu pensar, existia profunda similaridade naquela dupla, pois ambos seguiam trilha de esforço, juntos carregavam o peso da responsabilidade, e ao mesmo tempo, compartilhavam a missão de levar confiança. O boi, passeando lentamente, mostrando que a paciência pode superar obstáculos, o condutor, com sua determinação, ensinando que é possível encontrar direção mesmo nos percursos mais difíceis.

Já retornando a Maceió, solidifiquei a certeza de que o encanto do ranger há pouco escutado, estava em sua autenticidade, por se tratar de ruído natural, bruto, que não precisava de adornos para emocionar, pois se misturando o mugido do boi, com o barulho das rodas sobre o chão, ao murmúrio de conversas ao longe, criava-se uma sinfonia que só existe nos enredos do interior.

Cenário que para quem escuta, é um convite à contemplação, lembrança de que há beleza no simples e magia no cotidiano, é o eco da história, tradição e espírito forte de um povo que, mesmo em meio às mudanças do mundo moderno, ainda encontra poesia no chiado dos pneus de madeira, verdadeiro alento a esperança.

 

 

 

 

 

Alberto Rostand Lanverly – Presidente da Academia Alagoana de Letras

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