O VASO DE OURO –

O vaso sanitário é “obra de arte” feita em ouro de 18 quilates. A criação é do artista plástico italiano Maurizio Cattelan que o batizou com o nome de América. Como nesse tipo de vaso não se coloca flores, o que ele imaginou incorporar sobre o nosso Continente?

O trabalho, avaliado em cinco milhões de dólares, foi furtado do edifício em que nasceu Winston Churchill, o Palácio inglês Blenheim, que é reconhecido pela Unesco como patrimônio mundial. Para lá, a obra referida foi mandada pelo Museu Guggenheim em Nova York após a sua exposição. Antes do envio, o Museu tentou destinar o objeto para uso pessoal do presidente Donald Trump.

Vaso sanitário é uma criação inglesa do século XVI, projetado por um neto da rainha Elizabeth I. Veio para substituir as latrinas infectas, que tantas doenças causaram. No tempo, algumas melhorias foram introduzidas ao modelo original. Uma das mais significativas foi feita no Japão. Lá, a função é controlada por computador. O “chuveirinho” foi substituído por um tubo fixo e a tampa plástica é aquecida. Os japoneses também disponibilizam um chinelo para quem pretende usar esse banheiro.

O ouro é, sabidamente, uma preciosidade. Tem valor real e simbólico, é luxo, riqueza, moeda valiosa, adorno, de cálice consagrado, símbolo de amor nas alianças. Ninguém podia esperar que lhe dessem esse uso improvável, insólito, exótico, mas, por isso mesmo, tão ao gosto da mídia. Há um certo endeusamento do vaso.

Quando Moisés voltou do Monte Sinai, trazendo as Tábuas da Lei, encontrou um bezerro de ouro feito por Aarão para ser adorado. O “deus” lembraria ao povo judaico que melhor estariam como escravos do Egito.

Em verdade, toda obra de arte tem significação para a cultura desejável e a sua assimilação.

A matéria-prima escolhida para o vaso soa como agressão, não somente aos valores emocionais da estética, mas também por ser uma ostentação descabida quando se pensa que, no planeta, vivem 700 milhões de pessoas na extrema miséria.

Nowadays, any crap is art, em vernáculo seria: Toda merda agora é arte. A frase foi exibida no Festival de Arte em Veneza pelo artista potiguar, Ojuara. E logo se multiplicou em linguagens diversas. Até a Revista “ArtSpezial Biennale Venedig” deu destaque, inclusive com foto, do criador. Além disso, foi publicado um postal com o título em inglês: “Now Every shit is art”. O enunciado contra as mistificações, aqueles que são incapazes de criar verdadeiramente e tentam enganar com falso ouro.

Até mesmo deve-se reconhecer que a história registra Eruditas Vanguardistas que, como Marcel Duchamp, utilizaram o seu conhecimento artístico para chocar. Em 1917, Duchamp exibiu um mictório em sua exposição, deu-lhe o nome de fonte. Quinhentos especialistas consideram a peça uma obra de arte rigorosamente inovadora. Em concurso, foi premiado em segundo lugar, concorrendo com Picasso em sua obra “Les Demoiselles d’Avignon”.

Não só os artistas populares traduzem o microcosmo de sua vivência, mas também os que aprimoraram o fazer artístico e que têm como meta os valores universais. A arte reflete a cultura do produtor, a sua percepção da vida, da criação, das imagens.

O vaso sanitário de porcelana continua a ser mais útil do que o seu colega dourado.

 

 

Diogenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN

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