A campanha eleitoral, lá e cá – no resto do Brasil e no Rio Grande do Norte – vai chegando ao final dos seus mais de 100 dias como o torniquete que estrangulou seu próprio pescoço. Nunca, Senhor Redator, como desta vez, o marketing substituiu com tanto esmero e ardor argumentos por desaforos. Não foi apenas aquele prosaico ‘do pescoço pra baixo tudo é canela’, velha e sonora metáfora dos que advogam a pancadaria quando chamam de ‘desconstrução’ o jogo de agressões contra a vida pessoal.
As virtudes, nos grandes confrontos políticos, a rigor, nunca foram louvadas pelos adversários, e é natural que seja sempre assim. É da natureza do conflito. Mas é que são muitos os seus podres, suas mazelas, suas corrupções. Basta ligar a tevê. São eles os verdugos, quando não os próprios carrascos, como se merecessem vencer não os melhores, mas os menos sujos, aquele a quem a podridão sujou apenas as mãos e não chegou a alcançar o rosto, deixando a cara limpa escondida na máscara que usa.
Que escola de vida pública perversa é esta que ensina aos seus próprios filhos o método espúrio de como comprar de forma fácil um mandato? Desde que se tenha grana, não para servir aos anseios da sociedade, mas para servir-se num banquete familiar, de mesa posta na sala de jantar? Tudo parece falso, principalmente o que dizem, prometem, asseguram. Cadê a paz, os bons modos, o grande futuro de prosperidade, se o que oferecem ao eleitor que desejam conquistar é um punhado de lama no outro?
Sim, ninguém é perfeito. Nem os santos. Mas os anjos não desejam ser deputados e senadores, presidentes e governadores. Nem por isso é justo que a política reserve os piores, aqueles a quem temos que confiar nosso futuro. Foi-se o tempo em que o eleito de alguma forma era o melhor. Quando o exercício da política não era apenas a luta pela manutenção do poder. A qualquer preço, sob os mais dissimulados pretextos, agora vence o mais sabido, o ardiloso de plantão, o estrategista da esperteza.
A classe política precisa se convencer do seu papel essencial como garantia do estado de direito e da vida democrática. E que para exercê-la há condições e pressupostos inalienáveis que obedecem a um escopo que é alvo e, ao mesmo tempo, espelho de referência das reflexões. As campanhas perderam a noção de limite. Os protagonistas pisotearam o senso de pudor e transformaram a luta num tropel que, desembestado, passa sobre a dignidade humana de uns e outros num espetáculo de horror.
Ora, Senhor Redator, o que significa pedir aos eleitores que escolham e votem, se tudo que lhes é mostrado são exemplos do condenável pela lei e a ética? Ninguém há de esperar, num conflito, o fim do maniqueísmo, como se fosse possível suprimir o bem e o mal. Mas que luta é essa que leva seus exércitos a uma coragem enlouquecida, fazendo da disputa uma nova ópera do horror? Quem enlameia a vitória parece achar que feio é perder. Mesmo que, vitorioso, não se reconheça no próprio espelho.
Vicente Serejo – Jornalista e Escritor