OPERAÇÃO LAVA JATO EM JULGAMENTO –

O país assiste perplexo as repercussões, a favor e contra, a decisão tomada pelo ministro Dias Toffoli, do STF

O ministro anulou todas as provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht firmado com a Lava Jato em 2016 – a delação premiada da empresa.

Toffoli anulou também as informações obtidas em dois sistemas de computação da Odebrecht – “Drousys” e “My Web Day B.

Segundo a Lava Jato, esses sistemas continham informações sobre pagamentos de propina a políticos e teriam sido utilizados (e confessados) pelos executivos da Odebrecht para controle do “departamento da propina”, chamado de Departamentos de Operações Estruturadas.

Um servidor da empresa, que trabalhou nessa área, Camilo Gornati, afirmou que por questão de segurança, o “servidor” desses sistemas era guardado na Suíça.

O ministro julgou que as causas que o levaram a anular as provas são vícios insanáveis, ou seja, atos irregulares e contra a lei.

 Os impactos das medidas irregulares da Lava Jato, portanto, vão além do presidente Lula.

Inúmeros réus poderão ter seus processos revistos ou anulados, se confirmada a decisão.

A decisão foi prolatada na Reclamação (RCL) 43007 e confere os efeitos “erga omnes” (para todos), que tornam imprestáveis as provas e demais elementos, “em qualquer âmbito ou grau de jurisdição”.

Em consequência, tais documentos não podem ser usados em quaisquer ações criminais, eleitorais, cíveis ou de improbidade administrativa.

Essas provas anuladas por Toffoli já eram recusadas no STF, por decisão do então ministro Ricardo Lewandowski.

O entendimento beneficiou à época, por exemplo, o atual vice-presidente Geraldo Alckmin, acusado de receber propinas da Odebrecht, quando governador de SP..

O recente despacho do ministro Toffoli é monocrático (decisão proferida por apenas um magistrado) e qualquer revisão somente será possível, através de agravo regimental (art. art. 1.021, do CPC).

O prazo para interposição é de cinco dias, após a publicação.

Recorde-se, que em junho de 2001, o plenário do STF declarou a competência da Segunda Turma da Corte para julgar a “contaminação” das provas utilizadas pelo então juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, contra o ex-presidente Lula.

Posteriormente, a 2ª Turma confirmou a suspeição do ex-juiz Sergio Moro para julgar o ex-presidente Lula.

A maioria dos ministros entendeu que ele não teve um julgamento justo, no caso do tríplex do Guarujá (SP).

No momento, o fato novo, que cai como uma “bomba”, é a decisão do ministro Toffoli, que traz consigo repercussões políticas e jurídicas, acerca do desdobramento da Operação Lava Jato.

Do ponto de vista político, poderá ser a libertação definitiva de qualquer tipo de acusação de corrupção contra o presidente Lula e todos os demais beneficiados nas ações.

Significará uma carta de alforria para o presidente Lula, o seu partido o PT e aliados.

Em contraponto, qualquer fato novo, que desconstitua a versão do ministro Dias Toffoli será fatal para derrocada política deste grupo político.

É o típico “tudo ou nada”.

Do ponto de vista jurídico, a decisão do Ministro Toffoli repete posições já anteriormente assumidas pelo Supremo.

Não se pode negar que o texto tenha inegavelmente conteúdo doutrinário e legal, sobretudo nas avaliações de provas colhidas nos processos, porém antecipa juízos de valor, todos de natureza tipicamente política.

Por exemplo: o uso de expressões como a “constatação de que houve conluio entre a acusação e o magistrado”; fala em “situações estarrecedoras postas nos autos”, que tornariam “possível concluir que a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva, até poder-se-ia chamar de um dos maiores erros judiciários da história do país.

Vai mais além, ao declarar a existência de uma “armação fruto de um projeto de poder de determinados agentes públicos em seu objetivo de conquista do Estado por meios aparentemente legais, mas com métodos e ações contra “legem”.

Um fato grave acerca da legitimidade da prova colhida é a denúncia contida nos autos, de que as conversas gravadas jamais tiveram sua autenticidade confirmada e, ainda que fossem verdadeiras, não representariam nenhuma prática ilegal ou abusiva, como atestou o então corregedor nacional do Ministério Público, Orlando Rochadel.

Nessas gravações, existiriam trocas de mensagens secretas entre o ex-juiz federal, Sergio Moro, e o procurador da República Deltan Dallagnol.

Moro aparece dando orientações sobre procedimentos da Operação Lava Jato, da qual era juiz e Dallagnol coordenador.

Se não há confirmação da autenticidade desses diálogos, não haverá fundamento para suspeição ou condenações do juiz Sérgio Moro e procuradores.

Outro ponto a ser considerado na evolução desse caso são as evidencias do extraordinário volume de dinheiro devolvido aos cofres públicos, por confissão dos próprios culpados.

Nos últimos sete anos, já foram devolvidos cerca de 25 bilhões de reais desviados dos cofres públicos.

A Petrobras, até agora, é uma das maiores beneficiárias da devolução de recursos.

A estatal já recebeu em seu caixa 6,28 bilhões de reais, a partir de acordos da Lava-Jato com empresas, empresários e diretores que participaram do esquema de corrupção na empresa.

Ainda sobre a nulidade do acordo de leniência da Odebrecht, cabe lembrar que o gabinete do ministro Teori Zavascki supervisionou todos os trâmites.

Quando ele morreu, a ministra Carmen Lúcia prosseguiu com os trabalhos.

O Supremo homologou o acordo de leniência da Odebrecht.

A Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal chancelou igualmente o acordo.

Como se vê, a decisão do ministro Toffoli gera dúvidas, que certamente serão esclarecidas.

Não se pode, sob qualquer argumento, concordar com as condenações, que não respeitem o devido processo legal e sejam obtidas pela coerção, ou ameaças.

Por outro lado, os fatos públicos e notórios falam por si.

Neste ponto, a Lava Jato, no mínimo, apontou indícios veementes de práticas ilícitas, que para serem anuladas necessitam de fundamentos sólidos e transparentes.

Sabe-se que a origem ilícita da prova anula todo o procedimento.

Entretanto, pela extensão da Operação Lava Jato, inevitavelmente será gerado um “efeito dominó” sobre todas as condenações que tenham sido sustentadas com informações nos documentos considerados nulos.

Além disso, é possível que outros acordos de leniência possam ser revistos ou anulados.

Este será o desafio a ser enfrentado pelo Judiciário brasileiro, no deslinde da controvérsia, para que a história seja escrita com fidelidade aos fatos e não a versões.

 

 

 

Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; professor de direito constitucional da UFRN;  ex-presidente do Parlamento Latino-Americano, procurador federal, [email protected] 

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *