OS BARULHOS DA QUARENTENA – Alberto Rostand Lanverly

OS BARULHOS DA QUARENTENA –

Normalmente o ser humano, em seu cotidiano, quase sempre se vê exposto à ruídos nervosos, poluição do ar, e tantos outros riscos lhe afetando tanto a saúde, como a integridade física, levando-o muitas vezes a imaginar lhe faltarem horas para cumprir seus compromissos.

Os indivíduos, sempre que podem, desejam seus dias sejam harmoniosos como o som de uma orquestra, alegres como o sorriso das crianças e saudável tal qual o verde refrescante dos canaviais. Estes, porém dificilmente acontecem.

Recordo haver aprendido, com minha avó materna, “não haver mal que não traga um bem…ou dois, ou três”. Hoje quando o Covid19 reina absoluto, espalhando o medo, temos oportunidade de conviver com inúmeros fenômenos, que, normalmente, nem ao menos teríamos tempo para apreciar: o céu está mais limpo, enquanto o  mar parece brilhar com intensidade encantadora, fatos nos levando a concluir que, regularmente, a natureza fala e nós infelizmente não dedicamos tempo para ouvi-la. É triste, mas é verdade!

Assim, atento ao meio ambiente e seus sons, exercendo o afastamento social ora vigente, passei a escutar verdadeiras pérolas que fascinam o meu coração.

Logo cedo, mesmo antes do nascer da claridade, um galo canta nas redondezas e admiro-me, pois, somente edifícios compõem a vizinhança. O sol reluz na superfície do oceano, mais parecendo uma alameda infinita. Tomo café com leite em xicara que já me acompanha a muito tempo e, depois, da sacada da varanda, vejo a rua quase inabitável.

Enquanto os ponteiros do relógio caminham, uma grande variedade de sons é gerada por vendedores ambulantes, tentando atrair possíveis consumidores. Dentre estes profissionais, fomentadores da economia informal, destaque para os que habitualmente percorrem as ruas do bairro, fazendo uso de autofalantes ou da própria voz, como instrumento de propaganda, divulgando mensagens que os identificam com facilidade: “olhe a mandioca, olhe a papinha”, “picolé Caicó”, “mungunzá, o melhor da cidade, menina bonita não paga, mas também não vai provar”, “vai passando o carro do ovo”, “camarão barba roxa o melhor de todos”. Estas, são exemplos de frases funcionando como verdadeiros chamarizes para os clientes que buscam produtos de boa qualidade.

Paralelamente, escuto discussões entre casais, em apartamentos próximos, que aos gritos, debatem as suas diferenças. Apesar de tudo isto, porém, prevalece o silêncio, como já dizia Confúcio, “um amigo que nunca trai”. As horas andam. Em algumas oportunidades já no início da noite, ecoa nas redondezas, estridente ruído de panelas sendo amassadas, gerado por milhares de pessoas, que ao buscar satisfazer seus desejos, quase sempre políticos, esquecem ser que os verdadeiros necessitados, aqueles cujas caçarolas estão vazias, por falta de ter o que comer, e que residindo nas grotas e favelas da cidade, de repente nem mesmo forças possuem para amassar suas latas, também usadas como pratos.

Enquanto o silêncio reina, mais do que nunca eu me convenço de que: “A natureza produz sons, a civilização faz barulhos.”

 

 

 

Alberto Rostand Lanverly – Presidente da Academia Alagoana de Letras

 

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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