OS DIREITOS DA PRINCESA –
Nós que buscamos uma justiça eficiente, com celeridade, custamos a acreditar que uma ação proposta no século XIX será julgada agora. Mas é verdade.
A princesa Isabel promoveu (1895) uma ação reivindicando a propriedade e posse do Palácio Isabel (hoje chamado da Guanabara). Fundamentou o seu direito em ter-lhe vindo de um dote recebido no seu casamento com o Conde d’Eu. O marido acresceu a propriedade adquirindo os terrenos vizinhos.
Um golpe militar, em 1889, proclamou a República e expulsou o imperador Pedro II. O auto chamado Governo Provisório baixou o Decreto de número 78A que proibia toda a família real de possuir imóveis e estabeleceu o prazo de dois anos para a “liquidação”. Foi a primeira vez que um brasileiro (a) foi proibido de possuir terras no Brasil!
Desconfio que a República foi proclamada porque o rei estava velho e seria sucedido pela filha. Os adversários do regime imperial não perdoavam a princesa pelo fato de ela ser mulher, ter abolido a escravidão e praticar intensamente o catolicismo, quando dominava o movimento positivista. Além disso, o marido era um estrangeiro. Outros “defeitos” lhe seriam acrescentados como o de ser pessoa de prendas domésticas. A verdade verdadeira é outra.
A princesa Isabel era uma baixinha loura de olhos azuis e não tinha sobrancelhas. Aliás, a Mona Lisa também não tinha, e nem por isso deixou de ser o mais famoso retrato do planeta, a obra-mestra de Leonardo da Vinci. A princesa foi uma mulher cuidadosamente preparada para ser rainha. Estudara línguas e costumes dos povos. Falava fluentemente francês, inglês e alemão. Estudou, durante 14 anos, Ciências e Letras com os melhores mestres, entre os quais a Condensa de Barral. O imperador, homem culto, não perdia a oportunidade para lhe ensinar a ciência de Estado e tudo que lhe poderia ser útil. Foi a primeira mulher a governar o Brasil. Quando da permanência do rei no exterior, ela assumiu o governo por quase quatro anos. E soube bem administrar. Muitas coisas foram avançadas para a época, inclusive houve indicações para o que seria o futuro Mercosul.
A princesa estudou ainda, com afinco, ética e etiqueta palaciana, a arte da dança e de tocar piano.
O secular processo teve múltiplos julgamentos e sucessivos adiamentos e recursos interpostos, inclusive de tribunais extintos. Os dois últimos recursos estão para ser julgados pelo Superior Tribunal de Justiça. Serão julgados por cinco ministros da quarta turma que têm competência para julgar contratos, família e sucessão. O relator é o ministro Antônio Carlos Pereira, que ocupa, no Tribunal, a vaga de advogado.
Imagino que os herdeiros da família real, Orleans e Bragança, inclusive o recém-eleito deputado federal Luiz Philippe (PSL), não vão poder usufruir da herança palaciana. Anoto que na primeira eleição à Presidência da República não havia a existência de partidos. Qualquer pessoa poderia ser votada. E eleitores, talvez saudosos, votaram na princesa Isabel. Haverá um óbice processual. Provavelmente, será invocada a súmula 7 do STJ pela qual não se pode fazer reexame da prova.
A família real herdará apenas a memória de uma pessoa admirável.
Diogenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN