OS INIGUALÁVEIS CHEIROS DO SÃO JOÃO – Alberto Rostand Lanverly

OS INIGUALÁVEIS CHEIROS DO SÃO JOÃO – 

Caracteristicamente, a percepção é um processo que influi no comportamento do ser humano, no que diz respeito a sua melhor adaptação ao ambiente. Desta forma, surge a importância do desenvolvimento das áreas olfativas, que viabilizam a possibilidade de gerar emoções, após o processamento de diferentes aromas.

Em minha vida, de todas as coisas que vivenciei, as que mais me valeram a pena e das quais sinto mais falta, são aquelas que nunca pude tocar, apesar de permanecerem bem firmes em minha memória.  São os episódios abstratos, que, mesmo estando ao alcance de minhas mãos, não fazem parte do mundo material: O amor, a saudade, a alegria…

Outro dia, tive oportunidade de trocar ideias com um amigo, que, vitimado pela COVID, teve sua capacidade de sentir o perfume das coisas reduzido, e nele pude constatar o efeito devastador de tal ocorrência, pois o mesmo perdera o ânimo de comer, correr e, até mesmo, trabalhar.

As memórias que incluem lembranças de odores, tem a tendência de ser mais intensas e emocionalmente mais fortes. Neste mister, a época dos festejos juninos se apresenta, para mim, como imbatível, incomparável.

O característico cheiro de fumaça no ar, advindo das inúmeras fogueiras espalhadas, até pelas ruas pavimentadas, me remete a um passado inesquecível, quando, ainda criança, brincava com pessoas queridas, muitas, que entre nós já não habitam.

O odor e o brilho da pólvora queimada trazem à tona lembranças dos festejos ocorridos na Fazenda Angicos, lá em Caicó e, também, no Hotel Tavares Correia, em Garanhuns, para onde anualmente acorria com minha família, em busca de diversão.

O aroma das comidas típicas, como canjica, quentão, pé de moleque, pamonha, bolo de milho, além do próprio milho, cozido ou assado, são páginas de minha vida, escritas pelas quituteiras que fizeram história: minha avó, minha mãe, minha sogra.

O cheiro do perfume forte, usado pelos “matutos” integrantes das quadrilhas juninas, os rapazes usando roupas de tecido quadriculado e as mocinhas em vestidos de chita, com maquiagem transbordante de pintinhas pretas ao redor dos olhos, divertindo-se a valer, ao som das bandas de pífanos, que tocavam, tanto o inigualável alavantu e anarriê quanto o inesquecível “capelinha de melão, é de São João. É de cravo, é de rosa, é de manjericão. São João está dormindo, não me ouve não. Acordai, acordai, acordai João.”

É junho. Novamente é São João, que bom lembrar do cheiro de terra molhada pelo o sereno que teima em cair, os balões que eram as estrelas do interior, sempre subindo, iluminados pela luz do prateado luar, os sanfoneiros tocando, as moças sempre rezando, querendo um marido arranjar. E aqui, na cidade grande, apurando meu olfato, aguçando a memória, busco, lá no passado, os sonhos que, materializados, me dão a certeza de que o festejo junino é o único momento em que as luzes, os cheiros, os odores, as cores e os sons, se confundem em uma coisa só!

 

 

 

Alberto Rostand Lanverly – Presidente da Academia Alagoana de Letras

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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