Até que tome posse, nomeie os auxiliares e convoque os meios de comunicação para anunciar as prioridades emergenciais, o governador eleito não tem a menor obrigação de dizer o que pretende ou o que já decidiu fazer. Nem por isso se desobriga do que a envergadura do cargo e dos encargos lhe joga nos ombros dia primeiro de janeiro. Quando herda, sem ter culpa, e assume, por dever constitucional, o que for interesse coletivo do Rio Grande do Norte na defesa do seu desenvolvimento e bem estar social.
O que é óbvio, e é, e até monótono de tão conhecido, na verdade não tem sido o empreendido pelos últimos governantes, daí o descrédito da palavra da classe política. A demagogia aliada à magia de um marketing voltado ao mesmo tempo para a mitificação e a mistificação, acabou corroendo a força da palavra que hoje não mais se concretiza. Antes, ainda tinha o halo da promessa, aqui e ali realizada por gestos isolados; hoje, bem se sabe, o discurso perverteu a arte da retórica e a transformou numa falácia.
Nada nesses últimos decênios perdeu mais de sua força e de sua magia do que a palavra. Não se trata de um saudosismo a desejar o velho exórdio e a fascinante peroração como queria Aristóteles. Não. Mas a palavra como um instrumento de afirmação na prática da vida pública para que os mandatos não se transformem num aventureirismo de ricos ou abastados, mas num exercício legítimo de uma vocação que sempre tem raízes no humanismo, desde os tempos românticos do bacharelismo no fulgor retórico.
Para ser gongórico como nos tempos de antanho, a palavra estiolou-se sob o sol abrasador da incúria intelectual. Agora não é mais a inteligência e a sensibilidade que superam a cultura letrada, como ontem. Piorou muito. O sabido com suas espertezas substituiu o inteligente, como se a habilidade de ter e acertar, pactuar e negociar, fosse a qualidade acima de todos os atributos do espírito. A vocação para a vida pública degradou-se no mercado dos haveres da politicagem, e o eleitoral perdeu para o eleitoreiro.
A nova geração que chega aos grandes postos da magistratura política, administrativa e judiciária não terá apenas o dever de ser e de parecer honesto, como a mulher do rei, para citar uma antiga sabença popular. É preciso demonstrar capacidade de enfrentamento de uma estrutura que envelheceu carcomida de vícios e precisa mudar. Sob pena – é o que a parece exigir – de cair no descrédito da opinião pública. Nem a ditadura militar resistiu com seus fuzis. Quando perdeu a classe média, perdeu sua sustentação.
É esse desafio, visível para uns e invisível para outros – os que subestimam – que vai impor a sua presença real no governo a partir de primeiro de janeiro. A vitória foi consagradora. Foi forte, capaz de arrancar o poder das mãos das velhas estruturas familiares que se revezavam há seis décadas, mas não faz milagres a partir da posse. É ao governante que caberá conduzir os governados ao bom caminho da recuperação. Como se soubesse a saída e do alto da sua mesa viesse para dizer ao seu povo: ‘É por ali’.
Vicente Serejo é jornalista e escritor