“Que filme nojento!”. Eu poderia dizer que a moça entrou na sala errada ou aproveitou o ingresso de alguém que não pode ir à sessão. Mas prefiro entender que exerceu apenas o seu sagrado direito de criticar. A exclamação que ouvi à saída da exibição do filme “Além da Ilusão – Planetarium”, em nada bate com conceito que tenho da referida película. Trata-se de uma obra que se insere no sinete do chamado “cinema de arte”, desenvolvendo a trama passada na Paris dos anos trintas do século findo, na qual duas irmãs trabalham com poderes mediúnicos para platéias reservadas, mediante paga, disponibilizando também os dotes sensoriais para atendimentos privados. Uma mercancia de almas, que rende alguns caraminguás às moças, sendo a mais velha, “Laura” a empresária e a mais nova, uma adolescente, “Kate”, a portadora de poderes extra-sensoriais de elevado teor. Um caça-níquel espiritual.

No enredo, o conteúdo tem tudo para ficar circunscrito ao ofício quase mambembe das senhoritas, até que a cobiça de um produtor cinematográfico (“André Korben”) as leva para os círculos incertos da indústria cinematográfica francesa, sob o discurso de novidade para um público cada vez mais exigente. Só que em razão do envolvimento voluptuoso e possessivo de “Laura” com “André”, dos devaneios do investidor e do avanço do nazismo por sobre a França, vai tudo de água abaixo.

Produção franco-belga, direção de Rebecca Zlotowski, tendo no estrelato Nicolle Portman, mas com excelentes performances também de Lily-Rose Deep (a médium propriamente dita) e Emmanuel Salinger (o empreendedor), “Além da Ilusão” aborda com delicadeza e até mesmo parcimônia, temas sensíveis como uma sugerida relação incestuosa entre as duas protagonistas, bem assim o delicadíssimo aporte da homoafetividade no campo das ligações espíritas. Obviamente esses argumentos, trespassados pelo viés político das ideias do Reich, não desafiam aprofundamento mais severo de nenhum desses rumos. Crê-se que é repassada ao expectador a tarefa de montar as suas próprias conclusões, inclusive com o timbre da grosseria, como narrado ao início deste escrito.

Vale a pena ver? Vale! Inclusive para redefinir, com os filtros morais de cada um, o que é real e o que é ilusório.

IVAN LIRA DE CARVALHO – Juiz Federal e Professor – ivanlira6@uol.com.br

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