PARA SALVAR O ESPETÁCULO –
As mudanças ocorridas recentemente no âmbito do futebol brasileiro sinalizam uma crescente alteração no contexto do esporte no país. As iniciativas que visam a modernização dos clubes, a postura empresarial e administrativa que abala o eterno amadorismo dos seus dirigentes, os investimentos financeiros internos e externos – incluindo a contratação de treinadores estrangeiros – mostram uma tendência para adoção de um modelo de gerenciamento que transforma as tradicionais agremiações em verdadeiras empresas.
O cenário aponta para uma tendência à renovação previsível em todas atividades artísticas, musicais e esportivas, porém desvia a atenção de um problema crucial que prejudica a prática do futebol como esporte, como um simples jogo, ou, em última análise, como espetáculo. É, a meu ver, a crescente e ostensiva indisciplina praticada em campo, pelos atores dos eventos. Os protagonistas do jogo aparentam não conhecer (ou insistem em desrespeitar) regras seculares e consagradas do futebol.
As desobediências começam pela falta de acatamento às decisões da arbitragem, que é responsável pela rigorosa aplicação dessas regras. Os árbitros, estabelecidos como a maior autoridade em uma partida de futebol, têm enfrentado enormes dificuldade para exercer a sua tarefa, que é conduzir, dentro dos regulamentos e das disciplinas, uma disputa. São alvo de constantes e descabidas interpelações pelos jogadores, pelos treinadores, pelos diretores, pela imprensa. Todos são passíveis de equívocos e enganos; o técnico erra na aplicação de uma tática ou na escalação de um jogador; a diretoria erra na contratação do treinador ou em alguma diretriz do seu time; a imprensa pode errar na análise de um lance ou de alguma ocorrência em campo ou fora dele. Porém, ao árbitro parece que é negada essa humana possibilidade do erro, cuja punição não pode ser aplicada por ninguém – seja atleta, treinador, torcida ou qualquer elemento – durante o jogo. O vício do desrespeito é tão arraigado que atinge até o recém adotado VAR (Video Assistent Referee), ferramenta eletrônica que auxilia em caso dúvidas da arbitragem e que, mesmo assim, parece não satisfazer a algumas vontades.
Vi recentemente em disputas dessas categorias de base, jogadores ainda juvenis, imberbes, impúberes, usarem de comportamento arrogante, indisciplinado contra os árbitros. São a prova evidente de que não foram educados no respeito às regras e que estas deveriam ser ostensiva e metodicamente ensinadas desde as menores categorias. Daria ensejo à formação de atletas respeitadores e mais preocupados com o seu desempenho como artista do esporte. Esses rompantes de indisciplina não vejo em outros esportes como, por exemplo, o Rugby, ou o Futebol americano, em que brutamontes mal encarados se engalfinham na disputa da bola e ao menor sinal do árbitro (geralmente um aparente fracote), afastam-se, obedientes e submissos às suas decisões; no Basketball, os grandalhões disputantes exibem a mesma atenção. Faço a citação dos principais esportes em que há contato físico, porém, em muitos outros a impressão que temos é a mesma.
No futebol, vemos a necessidade não de se criarem novas regras, mas, pelo menos do incentivo ao respeito com as já existentes e que são bastante úteis para orientar um bom espetáculo. Várias infrações não reprimidas e toleradas pelos mediadores revelam, na verdade, grande desrespeito aos adversários, à arbitragem e ao público. Os jogadores atuantes, reservas e treinadores deveriam ser severamente punidos por exercer qualquer tipo de interferência na atuação dos árbitros, para que esses profissionais possam atuar com a necessária tranquilidade, evitando-se pressões individuais ou coletivas que possam gerar insegurança e dúvidas nas tomadas de decisões. Assim, acredito que aumentaria o prazer em assistir, sem irritações e dores de cabeça, ao que outrora era chamado espetáculo de futebol.
Alberto da Hora – escritor, cordelista, músico, cantor e regente de corais
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