PASSADOS PRESENTES –
Nesses dias de recolhimento, apareceu tempo e oportunidade para arrumar a casa e para revisitar e ordenar nossos trecos e nossas tralhas. Acho que muitos estão fazendo isso. E, no afã de organizar, reordenar e limpar alguns cacarecos, esta semana dei de cara com uma esquecida e encostada máquina de escrever. Num quarto de despejo, debaixo dos embrulhos de uns ternos de futebol, lá estava ela, pesadona, encapada, banguela de algumas teclas, porém com um olhar zarolho de firme e clara repreensão.
Era como se reclamasse do tempo em que, vencida pelos modernos apetrechos e geringonças tecnológicas, foi relegada e despojada das suas outrora utilizadas e apreciadas funções, do tempo em que era testemunha de muitos dos meus arroubos profissionais e literários. E, por instantes, pareceu-me ouvir os plec-plec e toc-toc daquela Olivetti fixa, sobrevivente de uma equipe que incluía outra, portátil, da mesma marca, e uma Remington Sperry Rand, silenciosa e macia, depois doada para um amigo. Companheiras e cúmplices, cumpriam a tarefa de encher folhas e laudas com o produto de trabalho e aventuras intelectuais.
Sou, então, forçado a lembrar das primeiras amigas, das pioneiras máquinas que ajudaram moças e rapazes a “tirar” o curso de datilografia, ferramenta essencial para quem almejasse um bom emprego, segundo o senso comum. Vejo-me na Liga Artístico Operária a “bater” as letras dos exercícios iniciais: “a-s-d-f-g”, mão esquerda, “ç-l-k-j-h”, mão direita. Depois, as linhas inferiores e as superiores, até a emoção de construir as primeiras frases, sugeridas nos exercícios. Alguém lembra? “Papel pautado da papelaria” foi a minha primeira.
Gozava a felicidade de estar aprendendo datilografia, sonho acalentado desde o dia em que assisti um rapaz vizinho nosso exibir-se na máquina tosca e envelhecida do seu pai, escrevendo sem olhar para as teclas. Ou então, de visita ao escritório da Rede Ferroviária, ver seu Etevaldo dos Anjos, com a velocidade e a destreza de melhor datilógrafo da empresa, produzir pilhas de documentos diante dos nossos olhos atônitos. Foram os meus primeiros ídolos, enquanto revelava e alimentava a minha disposição de também tornar-me um datilógrafo! Os pais incentivaram, adotaram a ideia, e, depois dos seis meses previstos para a “formatura”, saía do curso da Liga com um diploma singelo, porém transformado em chave para o meu futuro.
As primeiras atividades práticas foram no Sindicato dos Ferroviários, quando o meu pai era presidente. Eu, orgulhosamente, preenchia fichários, “batia” memorandos e aproveitava para exercitar velocidade na escrita, pensando um dia ser um batuta na máquina de escrever, como era seu Etevaldo. Depois, integrando a União dos Estudantes de Comércio, preparando carteiras de estudante a 50 centavos por peça preenchida. Tornei-me o mais veloz nessa atividade, conseguindo os melhores trocados por conta da minha recém adquirida habilidade.
É um resumo do meu caso de amor com as máquinas de datilografia. Com elas fui hábil e competente como em nenhuma outra atividade, por isso lhes tenho muito respeito. E àquela que encontrei esquecida e feiosa no meu quarto de despejo, vítima da minha negligência e vencida pelo progresso inexorável, prometo procurar um técnico que ainda possa existir, para curar-lhe as feridas, repor suas perdidas teclas, lubrificar suas juntas, reaver suas fitas rubro-negras, tirar o seu olhar entristecido e torná-la, mais uma vez, útil e produtiva. Assim, talvez ainda seja capaz de gerar, em folhas de papel e carbono, as peças que hoje fazem parte da sua história vitoriosa.
Alberto da Hora – escritor, cordelista, músico, cantor e regente de corais
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Que texto bem escrito e criativo! Eu também fiz curso de datilografia, mas nunca tive uma máquina só minha. Eu cuidaria bem dela!