PAU DE DEFUNTO –
Enquanto muita gente divulga aqui que viaja para as Américas, Ásia, África, Europa e Oceania, eu continuo viajando pela terrinha e revendo amigos, afinal sou funcionário público, pequeníssimo empresário, não tenho dinheiro para andar por aí, com malas recheadas, mesmo que sejam de roupas
Fui à Serra de Martins ou do Martins à procura do amigo Atílio Pereira. Fernandes Pimenta, meu primo, que mora lá há muito tempo. Pois bem, chegando por lá, tomei informações de onde mora Atílio e indo até sua casa, fui atendido por uma mulher jovem e bonita, que se apresentou como Angelina, pensei que fosse sua filha, mas não perguntei. Ela me informou que o Atílio tinha ido ao sítio, mas voltava logo, pois vinha para o almoço. Esperei, quando me viu Atílio fez uma festa danada como sempre fazem os amigos, mandou colocar água no feijão. Começamos a tomar uma branquinha e o papo começou.
– Olha Guga gostei muito do seu último artigo, em que você diz que a nossa geração morreu viva. È verdade, deixamos as coisas acontecerem e não tomamos as providências. Mas tem o lado engraçado, por isto chamei a Angelina minha mulher e relembrei uma história que se conta por aqui. Havia uma moça donzela, daquelas prendadas, chamada Maria de Fátima, mas todos conheciam por Fafá. Era filha Zé Paulino e neta do velho João Matos muito conhecidos aqui na região. Era uma mulher bonitona, daquelas que parece uma égua manga-larga, onde passava chamava atenção. Desde menina já era formosa. Quando mocinha a rapaziada toda doida para namorar com ela. Mas, ela só tinha os olhos para Givaldo um primo seu. Bem, os dois namoraram, a data do casamento foi marcada. Festão por aqui, veio muita gente e muitos parentes da Paraíba e do Ceará, foi festa grande. Bom, a vida de casado começou. Ela uma mulher decente, senhora dona de casa, e dizia a todo mundo que queria uma grande prole. O Givaldo um caboclo forte, alto, bem parecido, tinha um sitio pras bandas de Salva Vidas um lugarejo aqui perto. Era home trabalhador, saía de manhãzinha e só voltava à noite com a cara enficada no trabalho.
Um dia ele levou uma chuva muito grande e chegou em casa meio derrubado, com febre alta. Daí veio uma tosse e pegue remédio, era remédio de farmácia, todo tipo de chá que se ouvia falar. Não tina jeito de Givaldo melhorar. A Pobre da Fafá danou-se a rezar, fazer promessa pra tudo que era santo, mas num havia melhora e Givaldo veio a falecer. Fafá ainda jovem fez um juramento; não se casaria mais.
Pois bem, logo depois do enterro, a viúva manda buscar um entalhador famoso, lá pras bandas do Ceará, desses afamados assim como era nosso amigo Manchinha, pra entalhar a figura do Givaldo em madeira de lei no tamanho natural. Ficou uma perfeição e todo mundo que via, dizia – a madeira do defunto é uma perfeição.
Mas o tempo apaga tudo, Givaldo que era bem tratado, limpo e beijado todos os dias, foi ficando encostado, num canto empoeirado. Tinha aparecido um gaiato e a viúva passou. Todo o mundo aqui viu a mudança, Fafá era só alegria, seus olhos voltaram a brilhar ter alegria, ter vida. È por isto que o povo diz – amor que fica é amor de…
Um belo dia de inverno, fazendo um frio desgraçado, o marmanjo estava já dormindo na casa de Fafá, quando se sentiu mal e pediu um café. Fafá acorda a empregada Maria e lhe pede para fazer um café bem quente. Foi um corre, corre, das duas atrás de lenha e nada de encontrar. De repente Fafá olha e vê a estátua do Givaldo lá no canto empoeirado, sem utilidade. Olhando pra Maria a ordem foi dada. – Lasca o Givaldo e pega a madeira pra fazer o fogo. Ordem cumprida, a estátua lascada, foi pro fogo e Givaldo virou cinza. No outro dia, as cinzas jogadas no lixo. Moral da história: “madeira de defunto nem pra cinzas serve”.
– Ô amigo Atílio, o que tem haver esta história com o meu artigo?
– Você falou que morremos vivos por falta de atitudes, eu estou lhe mostrando que daqui a pouco, vamos morrer mesmo e a terra vai comer isto aqui não vai vale nada, já tem muito neguinho mijando sentado, pra não molhar os pés. Alguns “amigos” depois de velhos se meteram à besta, abandonaram as amizades antigas, querem ser mais importantes do que a Rainha da Inglaterra passaram a frequentar outros ambientes e esqueceram-se dos aconchegos, das conversas e carinho das velhas amizades. A nossa maloca dissipou-se, existem poucos índios, e são os verdadeiros amigos.
Pensei muito na conversa que tive com Atílio, vi que ele estar com a razão, alguns “amigos” são como ave de arribaçã “se faz bom tem eles vêm e faz mal tempo eles vão”.
Guga Coelho Leal – Engenheiro e escritor