Instituição e Governo –
Publicado em O PODER, 6/4/21
Os interesses da instituição militar e do governo podem ou não serem convergentes. No início do governo Bolsonaro os interesses tanto das Forças Armadas como do Presidente, apresentaram alto grau de convergência. Ambos tinham um objetivo comum: afastar o PT do governo. Por temerem que o Brasil fosse a próxima Venezuela. O tuíte do General Villas Boas foi claro e Bolsonaro o agradeceu publicamente.
Esta aliança entre instituição militar e governo foi, gradativamente, se solidificando. Ministros militares—inclusive da ativa foram nomeados. Seis mil para posições no aparelho de estado. Bolsonaro patrocinou benesses salariais, previdenciárias e orçamentárias para os militares. Simultaneamente, ocorreu a militarização do governo e a politização das Forças Armadas.
O Presidente tentou no ano passado fechar o STF brandindo o artigo 142. O Alto Comando do Exército vetou a aventura. Bolsonaro não desistiu de seu intento. No meio do caminho, todavia, surgiu a pandemia. E com ela, uma grave crise econômica, social e humanitária. O general Pazuello, da ativa, foi visto como um dos responsáveis pelo fiasco. Isto afetou a imagem e a autoestima das Forças Armadas. Bolsonaro já vinha desgastado pela saída dos generais Santos Cruz e do porta-voz, Otávio Rêgo Barros. Ao chamar a instituição castrense de “meu exército”, Bolsonaro cruzou a linha que separava o governo da instituição. Receosos, ante o pedido de maior alinhamento político, os comandantes militares refugaram. General não bate continência para capitão, apenas para presidente da república.
O poder civil é tão fraco que nem convocou os três comandantes para explicarem se foram demitidos ou se demitiram. As substituições foram feitas e o Alto Comando do Exército, praticamente, impôs o novo comandante do Exército. O general Nogueira, momento antes, deu uma entrevista mostrando que seguia muito mais as ordens da OMS do que a do Presidente dentro dos quartéis. Bolsonaro perdeu o jogo.
Isto não significa que a democracia saiu fortalecida. Perdura a falta de um sólido controle civil sobre os militares. Desde 1985, como venho advertindo. A tutela militar continua variando o grau da mesma: ora maior ora menor. Não há interesse civil em avançar rumo a uma democracia de qualidade. A democracia eleitoral, com todos seus vícios, é suficiente para os poderes civil e militar.
Jorge Zaverucha – Doutor em ciência política pela Universidade de Chicago (EUA), é professor titular do departamento de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco