1- Os gregos antigos consideravam que quando algo é indispensável e, todavia, impossível, a situação é trágica. Indispensável é a união dos atores políticos no enfrentamento da grave crise política que nos assola. Mas, ela parece impossível nestes dias.

Executivo, Legislativo e Judiciário juram defender a democracia. Contudo, cada um destes poderes joga, ao seu modo, água no moinho do autoritarismo. A surpresa é o comportamento do STF. É verdade que a Corte Magna já vinha violando a Constituição, além de criar leis. Contudo, passou, também, a se imiscuir em áreas de competência do Executivo. Prejudicando a capacidade do mesmo em governar.

Como, por vias democráticas, podem a sociedade civil e o Executivo se oporem a estas manobras condenáveis? Teoricamente, há alternativas. Mas, na prática não funcionam. Já há vários pedidos de impeachment protocolados contra membros do STF, mas o Presidente do Senado, solenemente, os ignora. Outra possibilidade seria o Executivo incentivar um Projeto de Emenda Constitucional que mudasse a atual composição dos membros do STF, tempo de permanência dos mesmos e etc. Além desta PEC levar muito tempo para ser aprovado, não há vontade do Congresso em cooperar com o Executivo neste sentido. O STF e o Congresso são parceiros no objetivo de afastar o Presidente da República de suas funções.

Já o Executivo joga “o jogo duro constitucional”. Não chega a violar as regras constitucionais, mas as estica ao máximo para ver no que vai dar. Termina por esgaçar, cada vez mais, o tecido democrático. Afinal, democracia não é sua primeira preferência. Mas de quem o é?

Deste modo, estamos presenciando um equilíbrio “trembling hand” (“mão trêmula”). Qualquer sopro mais forte pode fazer com que a mão tremule tanto que saia dos contornos das linhas existentes na página da democracia. Já sabemos o que esperar, mas está difícil saber de onde e por onde virá o imprevisível.

2- Irritado como os ataques de fogos da noite do dia 13 de junho à sede do STF, seu Presidente ministro Dias Toffoli soltou uma nota. Dentre ela, afirmou: “Financiadas ilegalmente, essas atitudes têm sido reiteradas e estimuladas por uma minoria da população e por integrantes do próprio Estado, apesar da tentativa de diálogo que o Supremo Tribunal Federal tenta estabelecer com todos – Poderes, instituições e sociedade civil, em prol do progresso da nação brasileira.”

Seria alvissareiro para a democracia que Toffoli dissesse quem são os integrantes do Estado que insuflaram estas manifestações.

Ele revelará o nome dos agentes estatais?

3- Tudo pode ser mera coincidência. Mas, fica o registro.

Há algumas semanas, alguns PMs, na Avenida Paulista, bateram continência para manifestantes pró- Bolsonaro. O governo arrumou a desculpa esfarrapada de que naquele momento estava havendo um enterro de colega PM. Mentira.

Hoje, a despeito do pedido do MP de São Paulo, para que faixas pregando a ruptura democrática fossem aprendidas, os militares estaduais não estão cumprindo o pedido. A alegação é querem evitar tumultos (sic).

A PM/SP é a instituição, dentre outras PMs, que possui o maior número de integrantes. Praticamente, do tamanho da Força Nacional de Segurança Pública que é comandada por um coronel da confiança de Bolsonaro.

Caso Doria parece estar, lentamente, perdendo o controle da tropa. Tudo indica que apenas controla o oficialato. Há sinais de anarquia no país.

4– O jornal O Globo informa na edição de hoje (13/6/20) que “numa carta endereçada a comerciantes e moradores do bairro Laranjal, em São Gonçalo, traficantes anunciaram o início da cobrança de uma “taxa de segurança” na região. A ordem, impressa em folhas de papel e colocadas em caixas de correio pelo bairro, é assinado pela facção criminosa que domina a localidade. Segundo o aviso, a partir do próximo dia 20, cada morador do bairro será obrigado a pagar R$ 50 mensais. O valor cobrado de comerciantes é maior: R$ 300 por semana.”

O Estado no Rio de Janeiro está se dissolvendo como um sorvete. Um dos poderes extroversos do Estado é o da manutenção da soberania nacional. A segurança pública tornou-se uma questão de segurança nacional. E quem é responsável pela mesma são as Forças Armadas.

Para que haja democracia é preciso que antes exista um Estado. E que ele seja capaz de impor a lei em todo território nacional.

 

 

Jorge Zaverucha – Mestre em Ciência Politica pela Universidade Hebraica de Jerusalém, Doutor em Ciência Política pela Universidade de Chicago e Professor titular aposentado do Departamento de Ciência Política da UFPE

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