PESCARIA –

Há mais de trinta anos temos casa em Jacumã. Não sou adepto de pescarias. Não uso anzol nem redes. Precisa uma paciência de Job, que não tinha antes e muito menos agora. Minha isca é dinheiro. E, de peixe, o máximo que consigo é distinguir um bagre de um serigado. Meu filho, Júlio César, dá quinau em pescador.

No veraneio, o acompanho por toda a orla marítima do RN em busca de peixe. No mínimo, de Maxaranguape à Pitangui. Todos os pescadores o conhecem, e vice-versa. Mas, em Pitangui, sou mais conhecido do que ele. Por uma razão.

Compramos, outro dia, uma boa quantidade de peixes na Colônia dos Pescadores de lá. Júlio é exagerado, e compra como se fossemos consumir durante um ano; um dia desses, comprou uma quantidade tão grande (só um peixe pesava 18 quilos), que uma senhora lhe perguntou, doutor, sua família deve ser muito grande, né? Para tratar esse peixe todo leva um tempão.

Um pescador, educado, ofereceu-me uma cadeira, dessas de plástico, enquanto esperava. Agradeci, puxei a cadeira, e coloquei-a perto da beira do terraço. A cadeira escorregou, como sói acontecer com esse tipo, e caí fora do terraço. Felizmente, a altura era pequena e o chão de areia. Nada senti ou sofri. Um pescador correu e perguntou se eu queria água; agradeci. Ele trouxe uma cachacinha e aí eu tomei, pois ninguém é de ferro.

Daí em diante, toda vez que chegamos lá, escuto o zunzum. Um dos pescadores se aproxima, bom dia, professor, como vai?, antes mesmo de falar com Júlio, que escolhe e paga os peixes. Notoriedade conquistada a duras penas. Não se esqueceram da minha queda e, quando me oferecem uma cadeira, fazem questão de a colocar o mais longe possível da borda do terraço. Acho que confiam mais na cadeira do que em mim. Imaginem se levasse uma bengala.

Na certa, ficariam segurando a cadeira o tempo todo.

De qualquer forma, de tanto andar pelas diversas cooperativas e colônias de pescadores dessas praias, já conheço um bocado deles. Muitas vezes, não têm peixe para vender. Quase sempre, porém, a quantidade disponível é bastante razoável, e variada. São sérios e honestos. Mesmo que você nada entenda, como eu, não lhe impingem gato por lebre, ou bagre por serigado. Nas conversas, contam suas experiências, o tempo que ficam no mar, a alegria das boas pescarias e a tristeza das más. Enfim, as agruras da vida de pescador – que não é fácil, alem de perigosa.

Gosto do papo. Sempre que Júlio vai comprar peixe, o acompanho. E ele gosta da companhia. Às vezes, ele deixa que eu pague. Contrariado. Mão aberta, faz questão de pagar. E eu deixo. Não discuto com meus filhos.

 

 

Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores
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