POPULISMO, NEGACIONISMO E SUPREMACISMO: OS OUTSIDERS DO ANTI-SISTEMA PÕEM EM RISCO AS DEMOCRACIAS –
Parte IV – Os Riscos do “Efeito Orloff” (1)
1985. O Grand Prix das campanhas publicitárias foi concedido para um anunciante que fez muito sucesso à época: a vodka Orloff. A titulação da peça era “eu sou você, amanhã” e sua essência estava na ideia de que a bebida não causava ressaca.
Não se vivia os tempos digitais de hoje, mas a “memética” da época propiciava uma forma de “viralização” analógica, no tradicional “boca a boca”. Era comum algumas adaptações cotidianas das boas propagandas. Nesse clima, mais um sucesso publicitário virou moda. Daí, o “efeito orloff” virou conceito, no sentido de explicar tudo aquilo que acontece hoje e que se pode repetir no dia seguinte. Sem traumas ou ressacas.
Reporto-me à essa efervescência da publicidade para avaliar não só a repercussão da bárbara invasão ao Capitólio. É preciso ir além e saber dos riscos de repetição desse ato. Não se trata de uma percepção física em si, no sentido da Invasão e do vandalismo. No âmago dessa atitude é necessária uma percepção sobre os riscos de uma repetição comprometedora dos valores democráticos. Ou seja, diante de um movimento supremacista-negacionista, que se mantém firme e forte devido a musculatura “bombada” pelas redes, até que ponto os seguidores de fora dos EUA se sentirão estimulados para repetir as mesmas atitudes? Ou, na minha metáfora abrasileirada, o “efeito orloff” seria possível aqui?
Evidente que uma resposta imediatista será afirmativa. E há todos os motivos para isso, pelas demonstrações que tivemos na história política recente e pelas próprias verborragias do governo em apoio ao “trumpismo”. Os riscos da peça da vodka pairam no ar.
Parte IV – Os Riscos do “Efeito Orloff” (2)
Por outro lado, nessa construção temperada pela publicidade, penso que outra variável precisará ser vista. Dou-lhe a expressão apropriada: ressaca. Precisamente, tudo aquilo que a campanha da vodka não queria.
A ressaca de lá e a de cá podem acontecer e terem sintomas diferentes. E esse quadro permitiria uma restauração orgânica de subsistência, vital para a democracia. Afinal, torçamos e acreditemos que aquela invasão tenha gerado só ensinamentos.
Por lá, que o “trumpismo” possa assimilar a indiscutível derrota sofrida. Por todas razões possíveis, que esteja consciente de que sua minoria precisa se ajustar aos ditames democráticos do respeito ao contraditório. Por aqui, que essas lições possam ser relevadas, sobretudo, porque o ambiente nacional não está nada favorável ao governo. Política, social e economicamente falando.
A vodka continua sendo consumida e a ressaca parece tangível. Vale lembrar: o Ministério da Saúde adverte – o consumo de álcool pode gerar embriaguez e ressacas.
O ideal seria destilar a soberba para consumir a tolerância.
Alfredo Bertini – Economista, professor e pesquisador, ex-presidente da Fundação Joaquim Nabuco
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