Cristovam e Bacha: Rendo-me às Luzes da Experiência –
Nos limites do respeito intelectual e dentro das regras democráticas, parece-me indiscutível que Cristovam Buarque e Edmar Bacha são extraordinárias referências de homens públicos. Ambos reúnem formação técnica refinada em economia e com capacidade política comprovada. Fazem dos seus conhecimentos técnicos instrumentos dignos dos melhores compromissos públicos, bem apropriados, por exemplo, à crudelíssima realidade que o país atravessa e ainda carece de superar.
No blog do jornalista e conterrâneo pernambucano Ricardo Noblat, respaldado pela sua perspicácia técnica, o político Cristovam se manifestou sobre o atual e dramático contexto brasileiro. Do alto de quem já exerceu importantes funções públicas, chamou-me atenção no seu texto o sentido de se atentar para um simples verbo: AVISAR. Sim, a semântica dessa classe de palavra ao revelar uma ação, um processo ou um estado, traz com ela todo um sentido, justo por tudo que se assiste na cena política que faz a hora e não esperou acontecer. Assim sendo, Cristovam alerta para os inúmeros avisos que partiram e continuam a partir do Poder Executivo, diante dos graves temas que afligem a nação. Os sinais emitidos nas questões da economia, da saúde pública/pandemia, da educação/cultura e do meio ambiente têm causado todo tipo de impacto desfavorável, mas como dito por Cristovam, “não foi por falta de avisos”. Onde faltaram essas atitudes foi na verborragia de campanha, onde o apoio do “Centrão”, as facilidades para emendas e as eventuais irregularidades com o uso do dinheiro público, foram itens combatidos e negados. Neste ponto, a realidade tem mostrado o contrário e só reforça o argumento do alerta de Cristovam. Pelo que foi avisado e pelo que não foi.
Por sua vez, Edmar Bacha em recente entrevista, concedida ao jornal Valor, trouxe também à tona uma firme e contundente opinião sobre o momento da política e da economia. Depois de manifesto anterior, assinado por centenas de agentes atuantes no contexto econômico do país, desta vez se revelou também signatário de novo documento, em defesa das instituições e do estado democrático de direito. Por toda sua experiência pública e pela conjuntura mundial, Bacha sabe e conhece bem o quanto a estabilidade (a outra palavra chave deste texto) é um fator essencial para o ânimo na economia.
De fato, demonstrada essa sua preocupação com a falta de “estabilidade”, onde a insegurança na política reforça as incertezas na economia, Bacha fez da sua entrevista uma prova de competência com relação às políticas públicas. Ou seja, uma guia equilibrada na sua essência ideológica e precisa na interpretação dos fatos. Assim, tratou com destreza das evidentes preocupações dos agentes sociais e econômicos. E não deixou de criticar a lerdeza da equipe econômica, até mesmo por não se impor com alguns dos seus princípios liberais e daí decepcionar “os eleitores da Faria Lima” (apesar do pretexto natural da pandemia).
Duas figuras públicas que impõem o devido respeito e que trouxeram suas preocupações com o momento e o futuro do país. Diante de repetidas cenas de amadorismo na gestão pública, entendo que a voz da experiência é sempre bem-vinda nessas horas. No entanto, como disse ninguém menos que o genial Da Vinci, “as opiniões falham, mas a experiência não costuma falhar, justo porque se espera desta aquilo que não é capaz de oferecer”.
Pena que nessas horas, além do vigor ideológico maniqueísta que ignora as diferenças, ainda falta aquela dose de humildade digna dos sábios.
Alfredo Bertini – Economista e ex-secretário nacional do audiovisual e de infraestrutura do Ministério da Cultura
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