Por Trás de Brás Cubas e Palhares Há um Lobo em Pele de Cordeiro –
Após assistir às últimas declarações do digníssimo ministro da saúde sobre a pandemia e, particularmente, o andamento da vacinação, sinto-me um cidadão inseguro e diante de uma verdadeira encruzilhada. Faz sentido porque ele se revela, de pronto, tal e qual dois personagens da “escolinha do professor Raimundo”, que lhe garantiram um novo jeito de exercer seu ofício: como um puxa-sacos cheio de papo furado.
De fato, às vezes penso que suas falas se referem a um outro país, pois o Brasil real é bem diferente do que prega, invariavelmente com suas elucubrações inobjetivas. Nada tão ou mais loquaz quanto aquela farfalhada astuciosa típica de Rolando Lero. Noutras ocasiões, creio que esteja numa corda bamba, entre ter que servir a um governo negacionista e o risco de por em xeque sua credibilidade profissional, diante da comunidade médico-científica. Aqui, ele assume aquele papo bajulador e de arrodeios, tanto quanto o de Armando Volta.
Pensando bem, cá com os meus botões, é preferível dispensar tal respaldo da “escolinha” e daí mergulhar fundo na minha compreensão sobre esse ser dúbio. O danado é que, em se tratando de uma autoridade pública de um setor sensível e que enfrenta a pior crise da história, ter esse tipo de comportamento pode representar um perigo para a dimensão da tragédia. Por mais que a opção pela métrica do descaso com a pandemia, seja algo comum entre os áulicos e os acólitos defensores do governo. Assim, vale tentar uma outra opção analítica, que se diga mais consistente e menos jocosa.
Nessa linha alternativa, recorro mais uma vez à riqueza e diversidade que só mesmo a literatura pode proporcionar. E, dessa vez, com uma moldura que ouso chamar de eclesiástica, por recorrer a uma expressão dita por Cristo e presente no Novo Testamento. Explicarei melhor a seguir. Antes, porém, preciso justificar a incontinência verbal do ministro, que tanto me inspirou nessa reflexão.
A minha primeira impressão dos recentes depoimentos, faz-me achar que vivo noutro país. Ou mesmo, entender que toda verbiagem nada tem a ver com a triste realidade brasileira. Antes, vale ressaltar que, nunca houve da parte do ministro qualquer demonstração de humildade ou arrependimento, considerados os erros cometidos pelo governo a que serve, por mais que a responsabilidade maior não lhe caiba por inteiro. Não obstante esse registro, acrescento que confundir as estatísticas, priorizar números absolutos (em vez dos relativos), não admitir os atrasos do programa de imunização (PNI) e outras falhas correlatas são mesmo posturas inadequadas. E o pior de tudo isso é voltar atrás de decisões e daí passar o recibo da insegurança e desconfiança que o governo tem demonstrado com relação à pandemia e às estratégias cabíveis ao seu enfrentamento. Nesse sentido, o episódio da vacinação para adolescentes foi o ápice, pois não só inexiste decisão contrária da OMS, como seus próprios técnicos, do comitê gestor do programa e da ANVISA, não tiveram dúvidas para desmenti-lo. Ficou mal na fita.
A outra postura que cabe indignação é vê-lo oscilante sobre aquela linha tênue que distingue visões opostas. Já o vi em defesa das vacinas, mas é comum ver o pêndulo a favor do negacionismo, quando se rende às pressões quanto ao uso de máscaras. Ou mesmo quando, repentinamente, sem qualquer iniciativa de ouvir outros agentes do processo, decide suspender aquela imunização dos adolescentes. Desse jeito, parece falar mais alto um novo ser, que se projeta numa disposição política insólita. Uma atitude que conflita com sua trajetória médica de credibilidade entre seus pares.
De qualquer forma, o ministro parece que quer apostar as fichas numa aventura eleitoral. O gosto pelo poder não lhe deu inapetência para sonhar como político e jogar para o alto seu conceito médico. Esquece que a dor da pandemia confere muito rigor em qualquer que seja a tomada de decisão dos que estão como protagonistas, na linha de frente.
Enfim, chegou o momento da conclusão e não posso aqui dispensar aquela ideia de associar as atitudes do ministro a personagens mais densos. Não que os da “escolinha”estejam distantes desse conceito. É porque posso, simplesmente, ater-me ao realismo do cotidiano, a partir da busca de elementos presentes na obra de dois nomes, que julgo como gênios nacionais: Machado de Assis e Nelson Rodrigues. E o arremate final fica por conta de aforismo extraído do Novo Testamento, embora que erroneamente há quem pense ser de uma fábula infantil.
Sobre os autores, apoio-me em duas figuras brasileiríssimas: o machadiano Brás Cubas e o rodrigueano Palhares. O primeiro, um verdadeiro exemplar do que representa o exercício diário do auto-engano tão presente na alma brasileira e visualizado pela pena competente de Machado, já na sociedade carioca do final do século XIX. O segundo, uma representação mais contundente desse “ser brasileiro”, que através das atitudes de Palhares, materializa o “canalhismo” tão presente na obra e nas tiradas de Nelson Rodrigues.
Quero dizer com isso algo simples e objetivo: o comportamento ziguezagueante visto nos depoimentos do digníssimo ministro nada mais representa que essas variantes comuns a muitos brasileiros. Exercem o auto-engano e querem ainda ser alguém mais esperto. No caso em pauta, endossa um certo “realismo” na política, em função de alianças e outros interesses eleitoreiros. Isso é o que gera todo descrédito no sistema, de sorte que faz-se surgir os falsos mitos ou salvadores da pátria, justo porque a construção do populismo depende desses pulhas. Aliás, esse novo “realismo” tem toda pinta de movimento moderno, antenado que está com essa “narcose digital”, como bem definiu o economista e filósofo Eduardo Giannetti.
Diante disso tudo, creio que coube o derradeiro alerta que deu forma ao titulo deste texto. Ou seja, sem o devido cuidado para escapar de tamanha pecha, o limbo que o ministro se meteu com esses depoimentos sem nexo, foi de se encontrar entre a cruz e a espada de um simbolismo realista, seja de Brás Cubas ou Palhares. Independente do ser brasileiro que está em cada um, cabe-lhe também a expressão cristã presente no Novo Testamento, na qual há os que se postam como “lobos em peles de carneiro”.
Alfredo Bertini – Economista, professor e pesquisador. Ex-Presidente da Fundação Joaquim Nabuco
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