Entre perdas e decepções, sobrevivemos para renovar a crença na esperança –
Não se trata de um artigo. Também não se trata de uma mensagem convencional, dessas que costumam se acumular no fim de ano.
Não sei dizer bem o que escrevo. Talvez um desabafo reprimido. Certamente, pode ser a tradução de um pacto que fiz comigo mesmo, com o “modo autorreflexão” acionado, uma vez superados momentos tão difíceis. Se for algo assim, meu sentimento foi por fazê-lo agora como um manifesto publico. Parece-me uma prova cabal do funcionamento deste “complexo e delicado mecanismo sentimental” que proporciona inspiração à vida, conforme escreveu Rubem Braga numa de suas tantas belas crônicas.
No desafio de restaurar a esperança, por aqui estar e daí poder sonhar, vale lembrar que “sobreviver” foi o verbo e “vacina” o substantivo. Muito embora todos advérbios da negação tenham sido usuais, exaustivos, repetitivos e desconectados da realidade.
Por isso tudo, que venha logo 2022. No balanço geral, a gente sabe das idas e vindas, das perdas e dos ganhos. Afinal, tem toda razão Lulu Santos quando diz que, “a vida é mesmo assim e há certas coisas que se a gente não sabe dizer”, torna-se também difícil explicar. Afinal, “tudo o que cala fala mais alto ao coração, porque somos medo e desejo, feitos de silêncio e som”. Sai ano e entra ano, assim vivemos nossa dicotomia antagônica entre o sim e o não.
Mesmo que os anos se repitam nesses seus contrastes, pelo que passamos e somos, sempre ê válida a renovação da crença na esperança. Passada uma inédita turbulência, devemos assumir o termo sobrevivente como adjetivo. E como somos movidos pelo otimismo exponencial, que nos contagia a cada final de ano, que tal assumirmos agora os papéis de sobreviventes esperançosos?
Ouso, enfim, um veredicto para 2022: vamos renovar a crença e instaurar a paciência. O segredo desta última, Lenine já prescreveu: “enquanto o tempo acelera e pede pressa, a gente faz hora e vai na valsa, pois a vida é mesmo tão rara”. Por isso; preservar vidas precede todos os princípios. Até a sagrada conquista da pouco entendida liberdade.
Detalhe vital: como fomos capazes de extrair tudo a que assistimos como lições em 2020 e 2021. Entre o “caos sanitário” e a “insanidade do caos”, fomos brindados com a oportunidade de rever muitos valores de uma vida em sociedade. Para difundir o bem ou apoiar-se no mal. Nesse jogo de escolhas, a esperança procura sempre se abraçar com tudo que dissemina o bem.
Seguirei firme com o que consigo extrair dessa minha intuição, embalado pelo realismo das crônicas de Braga e pelos versos melódicos de Lulu e Lenine. Para os que me irão acompanhar nessa linha tênue da esperança, direi que entre verbos, substantivos e adjetivos, estaremos sob a regência de 2022, num clima de total concordância.
Felizmente, direta ou indiretamente, a arte nos ajuda a superar as adversidades e apontar para a esperança.
Alfredo Bertini – Economista, professor e pesquisador. Ex-Presidente da Fundação Joaquim Nabuco
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