A Taxa de Desemprego não Revela o que Parece Ser –

Conceituar o Desemprego é como Tomar Sopa: Cautela no Trato Porque o Prato é Quente

Por sermos humanos, em muitas ocasiões não vemos as coisas como realmente são, mas como elas nos parecem ser. Não é só o destino que pode determinar o que se deseja alcançar. Há limitações materiais, técnicas ou relacionadas que nos deixam próximo do objeto pretendido. Ou seja, nem sempre a meta ou o ideal fixados está ao alcance das mentes ou das mãos.

Isso tudo não é diferente quando a análise econômica se insere no ambiente do mercado de trabalho e nele se depara com todas aa formas de ocupação ou desocupação da mão de obra. E antes que o ímpeto avassalador das redes sociais atropele o bom senso, que está por trás de todos conceitos técnicos, vale à pena fazer prevalecer um certo óbvio redundante – a “verdadeira verdade”. Assim, atenho-me às relações econômicas do trabalho, para tentar explicar com objetividade seus conceitos quanto à (des)ocupação.

Antes de tudo, diante dos costumeiros ciclos econômicos de prosperidade ou depressão, os efeitos sobre os mercados de trabalho são absolutamente tardios. As estatísticas que mensuram os distintos tipos de desemprego só registram as reações ocorridas no mercado de trabalho com certo “delay”. Ou seja, no início de uma recessão, o efeito do desemprego associado só se dá em levantamentos feitos após os indicadores de queda no PIB. Por outro lado, o efeito inverso também é real, pois a melhora na geração de empregos só será vista após os primeiros indicadores de crescimento do PIB serem registrados.

Não obstante essas constatações prévias, qualquer analise sobre o mercado de trabalho precisa levar em conta a peculiaridade dos seus conceitos. Isso se dá em situações de segmentações dos mercados, pautadas por uma heterogeneidade natural que advém do padrão da mão de obra.

Quase sempre uma variável que opera influenciada pela sua qualificação.

Essa distinção no perfil do trabalhador e o vínculo que ele gera com a atividade produtiva é o que bem define a formalidade ou não das relações. “Latu sensu”, no chamado mercado formal, as relações de trabalho ao serem submetidas aos ciclos econômicos, compõem tanto o emprego formalizado quanto o desemprego tipicamente conjuntural.

Por outro lado, quando esses ciclos se deparam com as atividades produtivas não organizadas, tem-se no mercado um comportamento reativo completamente diferente. O ensejo de uma recessão, tende a gerar duas situações não menos distintas na organização dos mercados de trabalho. Com a recessão, pode-se gerar o crescimento da ocupação informal, mesmo que esse fenômeno exponha a outra face de um desemprego, aqui visto como estrutural. Da mesma forma que essa situação de crise, pode levar o trabalhador ao desalento, justo por não estar à procura de vagas no setor formal e não desejar que sua força de trabalho se submeta à informalidade. Neste caso, tem-se o sentido do desalento que define outro nível conceitual de desemprego. Assim, quando esta nova categoria se soma ao desemprego estrutural, cria-se um mercado amplo, em direções opostas. De fato, uma informalidade que mistura ocupação sem vínculo com o empreendimento sem registro, um padrão que exige esforço para mensurar. Extrai-se daí a dimensão conceitual de um desemprego mais robusto, que não está captado pela mera taxa convencional. Afinal, esta representa apenas a aferição natural da quebra dos vínculos formais. Algo bem distante da realidade dos mercados

Numa percepção análoga, a simples percepção de criação de postos de trabalho medidos pela formalidade contratual, também não significa dizer que há estabilidade ou melhora no dito mercado. Seria necessária uma análise complementar sobre o fato dessa nova dinâmica de crescimento estar ou não fortalecida pela presença dos desalentados e informais.

Pelo que se pode ver nessa descrição conceitual, é tudo muito complexo para respostas impulsivas, sobretudo, quando alguma projeção favorável é vista, mesmo na miopia expressa no olhar sobre a taxa de desemprego. Toda análise nessa alçada pede por conhecimento e cautela, para que a precipitação não incorra em erro crasso de avaliação de cenários.

No comportamento distinto desses mercados, nem tudo que reluz é ouro. Para que tal análise não seja mal interpretada e usada a favor ou contra num embate eleitoral, cabe sempre a velha cautela de quem consome sopas quentes. Pode não fazer mal, mas é mais seguro tomá-la pelas beiradas. Ou seja, o entendimento dos conceitos de desemprego exige muita calma na hora de interpretá-los.

 

 

 

 

 

 

Alfredo Bertini – Economista, professor e pesquisador, Ex-Presidente da Fundação Joaquim Nabuco

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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