É o tipo do posicionamento centrado na música de Zeca Pagodinho (“deixa a vida me levar, vida leva eu”). Ou seja, eu não ligo para o que acontece. Eu chuto os fatos pra frente – numa gritante e vergonhosa demonstração de omissão e de falta de coragem para encarar fatos de dimensões relevantes. Outras colocações lançam o futebol para o terreno da desimportância, pois o Brasil “precisa mesmo é de saúde, educação e segurança de qualidade”. Outras inserem o insucesso da seleção no campo dos “altíssimos salários pagos aos jogadores brasileiros”, como se a remuneração dos tais não obedecesse às leis de mercado. Tem também aquelas que jogam toda a culpa do fracasso na corrução, na desorganização, na falta de disciplina do brasileiro, na nossa crônica impontualidade. E, pior dos cenários para o futebol, há os que prognosticam a inexistência de craques, de bons jogadores no solo pátrio.
Ora, se os jogadores da seleção são nomes de expressão em times do exterior, tal fato comprova que falta de craques não é a questão do futebol brasileiro. O problema é que, apesar de válidas e de conterem elementos positivos, tais colocações jogam fumaça demais em um tema que precisa de um diagnóstico preciso e objetivo. Para tanto, não se pode deixar de observar a questão na origem, na raiz: o estado atual dos times brasileiros e a inexistência de uma política de incentivo e de prática esportiva nas escolas brasileiras. Caindo aos pedaços – e entregue ao atraso, à desorganização e à dogmatização ideológica – o sistema de ensino pouco tem contribuído para o surgimento de talentos na seara esportiva. Por outro lado, os clubes… Misericórdia! É praticamente inalcançável um futebol de qualidade, de padrão internacional, com os clubes brasileiros vivendo na idade da pedra lascada no que diz respeito à gestão.
É impensável, com a estrutura atual, o futebol brasileiro continuar a ostentar o modelo que encantou o mundo até pouco tempo atrás, quando se vê times como o Vasco da Gama (o Vasco é só um exemplo; a praga acomete quase todos) precisando de empréstimo da Federação de Futebol do Rio (algo em torno de cinco milhões de reais) para pagar os salários dos jogadores referentes aos meses de abril e maio passados. E junho, e julho, e agosto, e setembro, e…? As dívidas do Flamengo já se aproximam do bilhão, as do Botafogo não ficam atrás, seguindo-se uma fieira sem fim de clubes pendurados em passivos a perder de vista. Em vista disso, como tê-los na função de celeiro natural de craques? Importante também se atentar para o fato do risco do Brasil perder um patrimônio incalculável – representado pelo conjunto das equipes de todo o país – conquistado a duras penas por mais de um século.
E as consequências? Recentemente, o Brasil chegou a figurar na 19ª colocação do ranking da Fifa; os atletas jovens, mal despontam, já são negociados diretamente para o exterior, sem passarem pelos times locais; o surgimento de bons jogadores quase inexiste, levando os times a contratar gente que já deveria ter pendurado as chuteiras, etc, etc. Está na hora, portanto, da modernidade de gestão alcançar o futebol brasileiro. Como também é o momento ideal para o governo apresentar um plano consistente que, além de editar leis que punam os dirigentes irresponsáveis e desonestos que infestam a cena esportiva, coloque a escola de uma vez por todas no verdadeiro lugar que lhe cabe nesse negócio. Aí o futebol brasileiro voltará a brilhar no campo da excelência. E o torcedor voltará à condição de gritar gol a plenos pulmões. É gol, é gol, é gol. É goooooooooolll!!
Públio José – jornalista (publiojose@gmail.com)
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