Ana Luíza Rabelo
Não se discute mais o fato de que a Mãe Natureza é sábia. Os artifícios usados por ela para a evolução das espécies são incontáveis. Desde catástrofes naturais a cadeias alimentares. Tudo é feito para que os mais fortes e preparados perpetuem suas características genéticas.
Infelizmente, o ser humano sofre da síndrome de Sofia (lembra do livro “O Mundo de Sofia”?) e não é capaz de viver imaginando que foi criado, projetado por algo ou alguém. Então, a criatura se rebela, foge e tenta subjugar o criador.
Através dos anos, desde os primeiros hominídeos que se têm notícia, lutamos para nos destruir, lutamos contra a cadeia evolutiva. Guerras, desde as cruzadas, passando pelas Grandes Guerras e chegando aos conflitos atuais, o homem impõe sua ideologia pela força, coagindo, uns aos outros, para a aceitação de suas crenças e valores pessoais, matando o criador alheio como forma de fortalecer o seu próprio, esquecendo-se que, independente da origem geográfica, acima da religião e ultrapassando valores econômicos, todos viemos do mesmo barro.
Há alguns milênios, o Egito, região mais abundante e próspera da época, foi acometida por pragas: gafanhotos, rãs, moscas. O que, para mim, parece um grave desequilíbrio no ecossistema, foi um período negro na história egípcia e é lembrado até hoje.
Há menos tempo, por volta do século XIV, a peste negra ou bubônica encarregou-se de dizimar, segundo alguns historiadores, um terço da população mundial da época. Ainda sobram inúmeras catástrofes naturais: a gripe espanhola (tão relembrada em tempos de H1N1), a tuberculose no século XIX, o tsunami na Indonésia em 2004, furacões, vulcões e tufões. São crises naturais, mas que ocorrem somente pela intervenção humana em questões que vão muito além do nosso conhecimento.
No último século, a criatura foi capaz de superar todas as expectativas com relação ao seu poder de destruição. Criou um método assassino, sem assinatura, que está cuidando de exterminar com seus pares num piscar de olhos. O homem criou a droga. Em sentido amplo, qualquer tóxico e entorpecente se enquadra no conceito.
A explosão de prazer é seguida pela angústia, desespero, terror e vício. Destruição de vidas e famílias num piscar de olhos. A abrangência dos destroços deixados faz inveja à bomba atômica.
Estamos morrendo por nossas próprias mãos. Estamos matando nossos filhos e netos. Em nome de coisa nenhuma, estamos maculando nossa história e nosso futuro. Depois de aniquilarmos os herdeiros, conseguiremos manter a cabeça erguida? O que será da herança?
Cuidar do futuro é um dever de todos os presentes, nós, que temos a dádiva da consciência, que detemos, ou deveríamos deter, a razão, estamos aqui para guiar os irmãos, para conduzi-los à uma vida reta e saudável, tanto física quanto psicológica, mas só teremos êxito nesta tarefa se pudermos protegê-los do mundo e de si mesmos, se pudermos poupá-los da incerteza e da fragilidade as quais a vida nos expõe. E só seremos fiéis no cumprimento desta tarefa se nos levantarmos e fizermos a nossa parte auxiliando quem trabalha, lutando contra o preconceito. Gritando e apontando ou denunciando, de forma anônima, não importa. O que tem valor é o gesto de amor e o poder de salvação que temos nas mãos.
Silentes, seremos comparsas de um crime vil. Calados, seremos algozes. A chance de nos tornarmos heróis está em nossas mãos. Não vamos desperdiçar uma vida, um futuro, levados pelo medo, vergonha ou qualquer outro sentimento menos nobre ou menos útil. Vamos dar oportunidade e consolo a quem não teria nada se nos calássemos. Vamos nos dar oportunidade de sermos melhores, pois quem cala consente, permite e aceita. Nós, não. Não consentimos, não permitimos e jamais aceitaremos que se deixem perder pessoas reais, com futuro, com sonhos e com possibilidade de pô-los em prática se forem salvos das drogas.
Salvemos o amanhã. Cuidemos das crianças e do planeta para que eles possam, de mente sã, governar um mundo são.
Ana Luíza Rabelo, advogada e escritora ([email protected])