QUANDO A INTERNET ME DECEPCIONOU… –

Acho engraçada toda e qualquer frase que inicia com “no meu tempo…”. Por outro lado,  surpreendentemente, eu a tenho usado com muito mais frequência do que imaginava ser possível.

No meu tempo era possível subir o morro do Careca. E descer rolando, cheia de areia no corpo, para, ao fim, esbaldar-me em um banho de mar gostoso.

No meu tempo vendia refrigerante em garrafas e pasteis fritos na cantina da escola. Devolvíamos o “casco” do refri e recebíamos em agradecimento duas balas xaxá.

No meu tempo a internet era discada e o fio passava por toda a casa. Escutávamos o som da discagem e rezávamos para ninguém tropeçar no fio e por a perder nossa meia hora aguardando o sinal.

No meu tempo eu aguardava chegar o index e procura a key word de minha pesquisa para ver as novidades na literatura. Então, anotava num bloco as referências bibliográficas e rezava para serem periódicos assinados pela biblioteca da UFRN, para, então, achá-los nas estantes, anotar na ficha catalográfica o empréstimo e ir para a xerox, para, enfim – ufa! -, ter a minha cópia e poder marcar com marca-texto amarelo (eram pouquíssimas as cores disponíveis NO MEU TEMPO!).

No meu tempo usávamos a internet para pesquisar textos e reportagens e a primeira coisa que me assustou no ambiente virtual foram as fotos do acidente aéreo com os integrantes do grupo Mamonas Assassinas. A indelicadeza em expor partes de corpos, destroços do avião, coisas assim. Não acreditava que o ser humano podia ser indelicado desta forma, sem se preocupar com as famílias e amigos daqueles que faziam nossos dias divertidos com suas músicas inusitadas. Eu (mais uma vez!) estava errada.

Hoje vemos coisas assustadoras! Casais que discutem se filmando e “jogam na rede”, repórteres entrevistando familiares que acabaram de descobrir suas perdas diante de hospitais, vídeos do YouTube falando sobre suicídios e afins.

Não preciso ir longe. Este tempo de pandemia recebi vários convites para acompanhar velórios “ao vivo”. Demorei para aceitar este trocadilho como uma verdade que nos dizem ser necessária em tempos de pandemia.

Discordo!

São momentos tão próprios, tão seus, que não entendo como alguém pode assistir de longe e ajudar…

Não sei mais o que veremos nas redes sociais que me decepcionem, mas, de verdade, continuo achando que no meu tempo nós éramos mais sensíveis à dor do outro…

 

 

 

Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, Professora universitária e Escritora

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