REFLEXOS DE UM OLHAR –
Na soma do que nos constrói, carregamos um misto de opiniões sobre quem somos, no resgate daquilo que irá definir nas ações de agora e o que se projeta para o futuro, numa reflexão que transcende a própria ideia de um posicionamento absoluto, vulnerável diante dos pensamentos existenciais e transcendentais.
Numa simbologia mítica do humano, onde a verdade nunca será encontrada, códigos de conduta como meras críticas, pressupostas pelo uso de máscaras sociais, nos mais diversos sentidos e objetivos, sejam para nos proteger do mundo ou, num sentido adverso, resguardar o mundo de nós.
O outro, enquanto parâmetro, é objeto simbólico que aparentemente reflete aquilo que almejamos, ou não. Porém, se aceitarmos a extração do que projetamos, naquilo que a princípio nos serviu de base, uma nova versão provavelmente aparecerá, numa visão nítida de que não está no outro, no reflexo do que queremos. É, sim, algo que está intimamente encravado em nós, nas nossas vontades e desejos de preencher aquilo que nos falta.
Daí, essa necessidade de transferirmos para o outro as nossas criações e fantasias; e, como se não bastasse, ainda querermos que o outro corresponda, exatamente, como desenhamos nos projetos internos de nossas resoluções. Caso este não corresponda às expectativas, há de se incorrer com os erros, dogmas e práticas impostas a ele.
Cada vez que usamos máscaras e nos deparamos com os nossos reflexos, quem estamos de fato enxergando? São os reflexos que trazemos na alma ou uma imagem ficcional? Quais personagens estamos montando nas cenas que compõem o filme de nossas vidas? Nenhum de nós sabe ao certo para onde vai, onde chega.
Na verdade, só temos a certeza que é nessa caminhada que está todo o nosso aprendizado, em cada mergulho que damos em nossa alma, quando a reflexão se faz necessária, em busca de respostas que só em nós poderemos encontrar nessa dupla jornada, interna e externa, com toda a contradição existente no paradoxo da existência humana.
A realidade subjetiva nem sempre é translúcida, porém, ainda que os erros sejam irrefutáveis, evidenciando a vida humana como algo intraduzível, indizível e misterioso, cabe a cada um de nós – nessa gangorra da vida, no limiar do viver e morrer – amar e odiar, entre verdades e mentiras, justiça e impunidade, vivendo entre o real e o sonho, acreditando (ou não) nas falsas posturas morais ou nas falsas razões edificantes.
É aqui que convivemos e, apesar de tudo, buscamos amar sem as pretensões do ego, simplesmente com o desejo de seguir, cada um, seus caminhos, tendo como prerrogativa o instinto mais nobre do animal: não trair nem dar ao outro as responsabilidades de sua felicidade, cabendo a si as escolhas dos caminhos bifurcados.
Pode ser simples, e não nos custa tentar mergulhar nas profundezas do ser, enxergar-se nos reflexos da alma, descomplicando o fazer diário, melhorando a convivência com nossos pares, valendo-nos da resiliência, compreensão e amor ao próximo, tangendo as coisas do coração aliadas à razoabilidade do cotidiano.
Equiparando as relações sociais e interpessoais na busca do novo fazer diário, onde o novo normal é cheio de anormalidades e nos ensina que muitas vezes precisamos nos afogar nos nossos erros para que a lucidez emerja e reflita em nossas vivências futuras.
Flávia Arruda – Pedagoga e escritora
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