RELÂMPAGOS E TROVÕES –

O que impressiona nesse livro de Sanderson Negreiros é que ele não usava gravador nas entrevistas. Fazia algumas poucas anotações e o grosso do material era todo armazenado na memória. Para infelicidade nossa não fotografou os personagens, todos, sem exceção, grandíloquos.

Eunice Weaver, que conversou com Gandhi, sentado numa esteira, durante três horas, e que dedicou a vida à causa dos lázaros. Floriano Cavalcanti, já aos 71 anos em 1967, fala das suas populosas leituras e vasta cultura, kantiano empedernido que era. Apreciador de perdiz guizada (nhambu, no popular e the famous grouse, in english) e uma taça de vinho por semana. Como advogados mais talentosos cita Raimundo Nonato Fernandes, João Medeiros Filho, Hélio Galvão, Manuel Varela, Múcio Ribeiro Dantas e seu próprio filho, Emanuel Wundt Cavalcanti de Albuquerque.

As nuvens continuam a chocar-se e as descargas elétricas iluminam a noite. Jessé Pinto Freire, de menino pobre em Macaíba a Senador da República. João Machado, de menino rico, estudante em Oxford – morou vários anos na Europa, falava inglês, francês, alemão, italiano e espanhol – a comentarista de futebol que deu nome ao nosso estádio, hoje derrubado e esquecido com um elefante branco em seu lugar, chamado Arena das Dunas.

 Haja relâmpagos. João Medeiros Filho – sou um ser com asperezas e certo romantismo -; Padre Manuel Barbosa de Vasconcelos, no dizer do repórter a maior vocação filosófica do RN e de uma inteligência sobrenatural; Otto Guerra, da infância de sertão ao otimismo de Teilhard de Chardin – nasci em 12, mas tenho certeza que não sou de 12 -, leitor incansável, talvez a maior biblioteca do estado; Padre Irala, um missionário da felicidade; Paulo Viveiros – sou apenas um advogado -, discorre sobre Direito (a figura acaciana do advogado desapareceu. O homem do fórum, das interpretações ortodoxas, das nulidades processuais) e política; Rômulo Wanderley, pai de Berilo e Gilberto, uma bela biografia.

Relâmpago e trovão juntos. Miguel Seabra Fagundes: aos 24 desembargador; aos 35 Interventor Federal no Estado; aos 36 Consultor Geral da República; aos 37 Ministro do STF; aos 44 Ministro da Justiça. É uma referência nacional e internacional em Direito no nível de Chico Campos e Pontes de Miranda. Theodorico Bezerra, a sabedoria sertaneja ao redor do mundo – meu segredo é acordar cedo, andar ligeiro e falar pouco -; Ney Leandro de Castro, afirma em 1984 que não pretende sair de Natal – a ânsia da viagem existe e há de persistir, mas sempre com o bilhete de volta -; Véscio Barreto dá um show de bom humor. Ao ser instado para tirar uma fotografia, rebateu: na minha idade a gente tira radiografia.

Agnelo Alves revela suas frustrações aos 35 anos; Gilberto Freyre em 82 já contava 84 anos, tal e qual Cascudo deixou obra definitiva; Elza Lamartine – Natal vale pelos amigos que tenho, embora seja cidade sem grandeza -; Esmeraldo Siqueira, médico, francesista, poeta e crítico ácido – amigo no rigor do termo é um milagre que pode acontecer raríssimamente -; Joraci Camargo, teatrólogo e membro da Academia Brasileira de Letras; Moacir Duarte fala sobre Aluízio Alves e Dinarte Mariz, seu sogro; Newton Navarro enceta um papo surrealista nonsense com o poeta repórter.

Até a próxima semana, com mais clarões.

 

Armando Negreiros – Médico e Escritor
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