Djalma Marinho era um ser simples, disponível, abordável, culto, democrático nas intransigências e nas concessões. Jurista de escol, transformou-se num dos mais admiráveis pensadores e iluminado parlamentar na Câmara Federal. O humanismo de Djalma transcendeu a ele, sobrepondose à própria contingência, principalmente pela humildade. Por ter com ele convivido de perto, entendo que era a partir dessa particularidade que consistia sua grandeza pessoal, com integridade, sabedoria e dignidade. Como político inaugurou um conduto de comunicação encantatória entre o ser e a própria vida. O seu canto na vida pública do estado ainda ecoa no centenário de sua existência e nos comove como uma canção que venceu os calendários e as trevas.
Advogado, professor, orador, humanista, parlamentar brilhante e honrado, Natal o homenageou, tempos atrás, com uma rua obscura no bairro de Candelária. E para descobrir essa pequenina artéria na anatomia da capital tive que consultar o ITEP topográfico da antiga Telemar. Djalma merece uma iniciativa larga, digna, plural, decidida e gratificante do próprio governo do estado com um resgate histórico da memória à altura do seu talento, de sua cultura, do seu mérito, do seu valor pessoal e semelhante ao brilho de sua passagem pelo Congresso Nacional, onde foi mais dignificado e lembrado do que no próprio Rio Grande do Norte, berço de sua maternidade.
Na passagem do seu centenário de nascimento saúdo o deputado estadual por duas vezes, o parlamentar federal sete vezes e mais do que tudo “uma lenda que impressionava as noites meninas, entre o real e o fantástico da política”.
Djalma foi o primeiro deputado federal em quem votei, em 1962, juntamente com o seu filho Márcio, para deputado estadual. Era o limiar de um novo tempo político de temperaturas e temperamentos. Mas a sua ternura promovia-se tanto quanto a sua cultura jurídica. Um homem de inegáveis claridades interiores demonstradas em vários episódios cívicos da vida nacional. Boníssimo, era incapaz de perpretar um mal a quem quer que fosse.
Devo dizer que aprendi muito com ele nas conversas amenas como acadêmico de Direito, ouvindo-o e a mim imprimindo marcas de eternidade através dos lúcidos conceitos. A sua postura calma nos acesos embates políticos e a sapiência revelada infundiam em todos uma impressão mística e espiritual de um capataz de longas esperas.
Acredito que as diferenças político-partidárias atuais não prevalecerão acima de um patrimônio do povo, hoje constituído pela herança, o exemplo e a conduta que Djalma nos legou e que não podem ser jamais ignorados. Embora nós todos estejamos mergulhados na transitoriedade de nossas ocupações e preocupações, nascidas da própria vida prosaica a que estamos indissociavelmente presos por profundos condicionamentos, o canto de Djalma Marinho fica para todo o sempre, atravessando gerações e gerações, a bater como um sino, a soar como uma bigorna, a ecoar como um trovão, a comover como uma canção. O seu canto é forte e eterno, é claro e belo. Nessa data resgata-se não apenas a sua memória, mas redescobre-se a sua luz, projetada longe na posteridade como ser humano indivisível, editado num único exemplar.
Valério Mesquita – Escritor, presidente do HIGRN – Mesquita.valerio@gmail.com
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