REPOSIÇÃO DE FATO HISTÓRICO – Valério Mesquita

REPOSIÇÃO DE FATO HISTÓRICO –
Na posse do famoso coronel Estevão Moura, no século dezenove, o engenho Ferreiro Torto vislumbrou tertúlias memoráveis, visitas ilustres de presidentes da província e dignitários do império, com banquetes e bailes. Como amigo da boa mesa, todos conheciam o modo fidalgo com que o coronel tratava seus hóspedes, fidalguia herdada por todos os seus descendentes diretos, sobre os quais, assevera mestre Câmara Cascudo: “foram fiéis ao signo da hospitalidade generosa, completa, ampla, inimitável”.
Com o falecimento de Estevão Moura, o engenho Ferreiro Torto, no espólio, coube a sua filha mais nova, Isabel Cândida de Moura Chaves, casada com Francisco Clementino de Vasconcelos Chaves, pais do jurista João Chaves, nascido na residência em 1875. Isabel Cândida vendeu a propriedade em 1900, para sua sobrinha Maria Suzana Teixeira de Moura, que na década de 1920, a transferiu para Francisco Coelho e depois a Bruno Pereira que se desfez do imóvel na década de 1930, alienando-o a Amélia Duarte Machado, que desde então o manteve até as terras serem desapropriadas pela prefeitura de Macaíba, em nossa gestão como prefeito (1974). Por ser patrimônio histórico, foi transformado em museu de Arte Sacra, mantido pela Fundação José Augusto, que tombou e restaurou o antigo palacete colonial, graças aos recursos da Emproturn.
Depois de funcionar como sede da prefeitura de Macaíba entre os anos de 1983 a 1989, o solar foi transformado em museu municipal na gestão de Odiléia Mércia da Costa. Posteriormente fechado, reabriu como museu regional na gestão Mônica Nóbrega Dantas. Novamente fechado e após sofrer assaltos e depredações, foi reinaugurado como Complexo Turístico e Cultural, em abril de 2003, apresentando coleções de fotografias antigas da cidade da Macaíba e dos seus filhos que se destacaram nos mais variados segmentos sociais, culturais e políticos.
O nome Ferreiro Torto teve origem em um coqueiro muito alto e torto, que existia bem próximo à porteira da fazenda, e quase embaixo dessa árvore um ferreiro havia montado a sua tenda e oferecia os seus serviços aos tropeiros, que por ali passavam a fim de corrigir as ferraduras dos animais. A história de sua restauração começou efetivamente em 1974, na oportunidade em que fui prefeito de Macaíba e desapropriei a área que circundava os escombros do sobradão. A questão foi ajuizada e com coragem mantive a decisão, encomendando um projeto de recuperação ao escritório do arquiteto Airton Vasconcelos, que se valeu das fotos existentes e das dicas dos habitantes mais antigos da cidade e historiadores.
Em 1975, deixei a prefeitura para assumir a presidência da Emproturn. Nessa estatal, no governo de Tarcisio Maia, enfrentei contenda com o diretor administrativo e financeiro Francisco Revoredo, que defendia a alocação do recurso no valor de um milhão de cruzeiros, à época disponível, com destino a sua terra Mossoró, e não para a restauração do Ferreiro Torto, em Macaíba. A divergência ganhou as manchetes dos jornais. E por fim, com o voto de desempate do diretor técnico Valmir Targino, fomos vitoriosos. Procurei o presidente da Fundação José Augusto Sanderson Negreiros e, através de convênio, a Emproturn repassou a importância mencionada para o órgão cultural responsável (FJA) afim de adaptar ou ampliar o projeto técnico antes elaborado. Muitas dificuldades junto ao Patrimônio Histórico foram, enfrentadas em Recife. O IPHAN restaurava monumentos mas não os reconstruía. Era a norma. Polêmicas foram travadas, porém ao final prevaleceu o critério da equipe técnica da Fundação José Augusto, chefiada pelo arquiteto Paulo Heider Feijó. O Solar, foi inaugurado em 1979, com as presenças do governador Tarcisio Maia e Franco Jasiello da Fundação José Augusto, além do governador do Pará, doutor Aloísio Chaves, neto do jurista João Chaves que morou e faleceu no Ferreiro Torto.
Esses fatos não podem ser esquecidos. Quando se falar sobre o Ferreiro Torto, devemos nos lembrar que sem a decisão inaugural e obstinada de desapropriar a área, conseguir os recursos e arrostar as dificuldades que se impuseram contra a reconstrução não existiria um legado tão importante da história do Rio Grande do Norte e de Macaíba.

Valério Mesquita – Escritor, Membro da Academia Macaibense de Letras, Academia Norte-Riograndense de letras e do Conselho Estadual de Cultura  e do IHGRN– mesquita.valerio@gmail.com

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
Ponto de Vista

Recent Posts

COTAÇÕES DO DIA

DÓLAR COMERCIAL: R$ 5,3920 DÓLAR TURISMO: R$ 5,6980 EURO: R$ 6,3310 LIBRA: R$ 7,2050 PESO…

2 dias ago

Protestos da Geração Z derrubam mais um governo, desta vez na Bulgária

O premiê da Bulgária renunciou nessa quinta-feira (11) após protestos em massa liderados pela Geração Z…

2 dias ago

IBGE prorroga inscrições em processo seletivo com mais de 200 vagas no RN

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) prorrogou até a próxima quarta-feira (17) as…

2 dias ago

Filho de sargento denuncia ter sido agredido por militar dentro de quartel do Corpo de Bombeiros em Natal

O filho de um sargento do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Norte denunciou…

2 dias ago

Câmara aprova lei que autoriza prefeitura de Natal a pegar empréstimo de R$ 660 milhões

A Câmara Municipal de Natal aprovou nesta quinta-feira (11), em regime de urgência, um projeto de lei…

2 dias ago

Metrópole Digital da UFRN oferece 59 vagas para profissionais e estudantes de TI e design; bolsas são de até R$ 6,2 mil

O Instituto Metrópole Digital anunciou a abertura de um processo seletivo com 59 vagas para…

2 dias ago

This website uses cookies.